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Capítulo 10: Capítulo 10

Página 110
Os candeeiros ainda estavam acesos, dando uma luz amarelada e, do outro lado do rio, o Palácio de Four Courts recortava-se em silhueta contra um céu carregado.

Gretta caminhava adiante dele, junto a Mr. d'Arcy, com os sapatos num embrulho castanho que apertava debaixo do braço, as mãos segurando a saia, por causa da lama. Já não havia nela nenhuma graça de atitude, mas os olhos de Gabriel ainda brilhavam de alegria. O sangue correu-lhe rápido nas veias, e pensamentos orgulhosos e enternecidos atravessaram o seu cérebro.

Ela deslizava tão levemente, ia tão direita que apetecia ir por trás, sem fazer nenhum ruído, agarrá-la pelos ombros e dizer-lhe qualquer coisa terna ao ouvido. Parecia-lhe tão frágil, que gostaria de a poder defender de qualquer perigo e depois ficar sozinho com ela. Momentos da sua vida íntima vieram-lhe então ao pensamento. Um envelope com heliotrópio estava por debaixo da sua chávena ao pequeno-almoço e ele estava a acariciá-lo com a sua mão. Os pássaros chilreavam na hera; o tecido da cortina, brilhante de sol, reflectia-se no chão: ele não podia comer, cheio de felicidade. Encontravam-se na plataforma com enorme multidão e ele colocava-lhe um bilhete dentro da luva, na palma da sua mão quente. Estavam ao frio, olhando para uma janela, onde um homem fabricava garrafas numa fornalha. Fazia muito frio. A cara dela, fragrante no ar gelado, estava muito perto da dele, e, repentinamente, chamara o homem da fornalha:

- O fogo está quente, senhor?

Mas o homem não podia ouvir, com o crepitar do fogo. Talvez fosse melhor assim. Podia ter respondido rudemente.

Uma onda de maior ternura escapou-lhe do coração e espalhou-se, como uma quente enxurrada, pelas suas artérias. Como a ténue luz das estrelas, momentos da vida deles em comum, que ninguém sabia nem viria a saber, assaltaram-lhe a lembrança. Ficou ansioso por lhe poder recordar aqueles momentos, fazer-lhe esquecer os anos de existência sombria e lembrar-lhe somente os momentos de êxtase. Porque o tempo, ele bem o sentia, não lhes arrefecera a alma. Os filhos, o seu trabalho, os cuidados dela com a casa, não lhes haviam extinguido o terno calor do sentimento. Numa carta que lhe escrevera tinha-lhe dito: «Porque será que as palavras assim me parecem tristes e frias? Será porque não existe palavra suficientemente terna para representar o teu nome?»

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Capa do livro Gente de Dublin
Páginas: 117
Página atual: 110

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 9
Capítulo 3 30
Capítulo 4 36
Capítulo 5 52
Capítulo 6 58
Capítulo 7 63
Capítulo 8 69
Capítulo 9 78
Capítulo 10 86