Gretta subiu os degraus atrás do porteiro, a cabeça inclinada, os seus débeis ombros como se fossem carregados, a saia justa. Podia ter-lhe passado os braços em volta e apertado o corpo contra si, porque os seus braços tremiam de desejo e só a força que fazia com as unhas na palma das mãos impediam o seu impulso.
O porteiro parou nas escadas para arranjar a vela. Eles pararam também, uns degraus abaixo. No silêncio, Gabriel podia ouvir o bater do seu coração contra as costelas.
O porteiro levou-os por um corredor e abriu uma porta. Depois, pousou a vela numa mesa do toilette e perguntou a que horas queriam que os chamassem.
- Às oito - disse Gabriel.
O porteiro apontou para o interruptor eléctrico e resmungou uma desculpa. Mas Gabriel cortou-lhe o fraseado:
- Não queremos luz nenhuma. A que vem da rua chega-nos. - E - continuou apontando para a vela - pode levar daqui esse artigo elegante...
O porteiro pegou na vela, mas vagarosamente, porque estava surpreendido com aquela ideia nova. Depois resmungou boas-noites e saiu. Gabriel correu a chave na fechadura.
Uma luz fraca do candeeiro da rua iluminava uma réstia do quarto, da janela à porta. Gabriel tirou o casaco e o chapéu, atirou-os para uma cadeira e atravessou o quarto até à janela. Olhou para a rua, a ver se acalmava um pouco a emoção. Depois, voltou-se e encostou-se a uma cómoda com gavetas, de costas para a luz. Gretta tirara o chapéu e o casaco, e estava diante do espelho a desabotoar o vestido. Gabriel parou durante uns minutos, a olhar para a mulher. Murmurou:
- Gretta!...
Ela abandonou o espelho e atravessou vagarosamente o quarto, em direcção a ele. Tinha no rosto uma expressão tão séria e apoquentada que as palavras não puderam atravessar os lábios de Gabriel: «Não, ainda não era chegado o momento!... »
- Pareces cansada - disse ele.
- Um pouco - respondeu ela.
- Não te sentes doente, nem fraca?
- Não, somente cansada...
Dirigiu-se para a janela e encostou-se, olhando para fora. Gabriel tornou a esperar e, sentindo que lhe era difícil dominar-se, começou repentinamente a falar:
- É verdade, Gretta...
-O que é?
- Sabes, aquele pobre Malins...
- Sei!... O que há acerca dele?
-Bem, pobre rapaz, é simpático apesar de tudo - continuou Gabriel numa voz falsa. - Pagou-me uma libra que me devia. Nunca esperei. É pena ele não se afastar de Browne, porque, na verdade, não é mau rapaz...