- Bem, eu tenho vergonha por si - disse Miss Ivors, francamente. - Escrever para um jornal daqueles!... Não sabia que você era um «West Briton»!...
Gabriel ficou perplexo. Era verdade que escrevia uma coluna literária, todas as quartas-feiras, para o Daily Express, pela qual lhe pagavam quinze shillings. Mas isso certamente não o tornava um «West Briton»...
Os livros que ele recebia para criticar eram talvez ainda melhor acolhidos do que o cheque. Gostava de sentir as capas e de acariciar as folhas dos livros acabados de imprimir. Quase todos os dias, depois das suas aulas, costumava também vaguear pelas ruas à caça de livrarias. Ele não sabia o que dizer. Queria explicar que a literatura ficava acima da política. Mas eram amigos de há muitos anos e as carreiras tinham sido paralelas: primeiro na Universidade e depois como professores. Não podia construir uma frase grandiosa. Continuou a piscar os olhos e, tentando sorrir, murmurou que as críticas de versos não significavam «fazer política».
Quando chegou a altura da mudança de par, ainda estava perplexo. Miss Ivors agarrou-lhe na mão com ternura e disse, num tom amigo:
- Eu estava brincando... Agora temos de
nos separar!... .
Quando ficaram de novo juntos, ela falou sobre a Universidade, e Gabriel sentiu-se mais à vontade. Um amigo havia-lhe mostrado a crítica duns poemas de Browning.
Assim descobrira o segredo, mas gostara imensamente da crítica. Depois, de repente, perguntou:
- Mr. Conroy, não quer vir a uma excursão às ilhas Aran, este Verão?.. Vamos passar lá um mês inteiro... Deve ser esplêndido, em pleno Atlântico... Devia vir... Mr. Clancy vai e Mr. Kilkelly e Kathleen Kearney também. Seria óptimo para Gretta! Ela é do Connacht, não é?...
- A família é que é - disse Gabriel, secamente.
- Mas vai, não vai? - insistiu ela, segurando-o com força pelo braço.
- O facto é que... já escolhi lugar para onde ir...
- Para onde?
- Bem... Todos os anos vou dar uma volta de bicicleta, com alguns amigos... - Mas para onde?
- Bem... Geralmente vamos à França ou à Bélgica, ou talvez à Alemanha - disse Gabriel, acanhadamente.
- E porque vai à França e à Bélgica, em lugar de visitar a sua pátria?
- Bem... Em parte é para ter contacto com as línguas, e em parte para mudar...
- E não tem que manter contacto com a sua própria língua?
- Bem, se vamos a isso, o irlandês não é a minha língua...