- O meu criado nada tem com isso, Basil. Imagina que eu o deixo arranjar-me o quarto? Põe-me às vezes as flores, nada mais. Não, quem pôs ali o biombo fui eu. A luz era forte demais.
- Forte demais! Pelo contrário, meu caro amigo. É um lugar admirável para o retrato. Deixe-me vê-lo.
Dizendo isto, Hallward encaminhou-se para o canto do quarto.
Dorian Gray soltou um grito de terror e correu a pôr-se entre o artista e o biombo.
- Basil! - disse, muito pálido. - Não, não quero que o veja!
- Não quer que eu veja o meu trabalho! Não está a falar a sério. Por que não havia de vê-lo? - exclamou Hallward, rindo-se.
- Se tentar vê-lo, Basil, dou-lhe a minha palavra de honra de que nunca mais lhe falarei em toda a minha vida. Digo-lhe isto muito a sério. Não lhe dou explicações, nem admito que mas peça. Lembre-se, porém, de que, se tocar neste biombo, tudo acabou entre nós.
Hallward estava fulminado. Olhava atónito para Dorian Gray. Nunca o vira assim. O jovem estava lívido de cólera. Tinha os punhos cerrados e as pupilas dos olhos chispavam-lhe como discos de fogo. Tremia dos pés à cabeça.
- Dorian!
- Cale-se!
- Mas que é? Claro está que não verei o retrato, se não quer que eu o veja - disse Hallward, com certa frieza, rodando sobre os calcanhares e dirigindo-se para a janela. - Mas, na verdade, parece-me absurdo não poder ver o meu trabalho, tanto mais que o vou expor em Paris no Outono. Será provavelmente necessário dar-lhe outra mão de verniz; por isso terei de o ver um dia, e porque não hoje?