O Retrato de Dorian Gray - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 240 / 335

Chegou de novo a luz à tela e examinou-a. A superfície parecia achar-se tal qual ele a deixara, sem haver sofrido a mais leve alteração. Era de dentro, parecia, que provinha aquela ignomínia, aquele horror. Devido a alguma estranha intensificação da vida interior, a lepra do pecado ia lentamente devorando o quadro. Não era tão terrível a putrefacção dum cadáver numa sepultura inquinada de humidade.

A mão tremeu-lhe, e a vela caiu-lhe do castiçal, ficando a arder no chão. Pôs-lhe o pé em cima e apagou-a. Depois atirou-se para cima da cadeira desconjuntada que estava ao pé da mesa e tapou a cara com as mãos.

- Meu Deus, Dorian, que lição! que terrível lição! Como única resposta, ouviu o soluçar do jovem, junto à janela.

- Reze, Dorian, reze! - murmurou. - Que nos ensinaram a dizer na nossa infância? «Não nos deixeis cair em tentação. Perdoai os nossos pecados. Purificai-nos das nossas iniquidades». Digamos isso ambos. A prece do seu orgulho foi atendida. Também o há-de ser a do seu arrependimento. Adorei-o demais. Eis o meu castigo. Você adorou-se também demais. Somos ambos castigados.

Dorian Gray voltou-se lentamente e fitou nele os olhos marejados de lágrimas.

- É demasiado tarde, Basil - balbuciou.





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