- Mas, certamente, chamar-se-ia, com razão, ao não-ser um nada, e não uma determinada coisa.
- Com certeza.
- Por isso tivemos, necessariamente, de ligar o ser à ciência e o não-ser à ignorância.
- Fizemos bem.
- O objecto da opinião não é, portanto, nem o ser nem o não-ser.
- Não.
- E, por conseguinte, a opinião não é ignorância.
- Parece que não.
- Portanto, esta para além de ultrapassando a ciência em clareza ou obscuridade?
-Não.
- Então parece-te mais obscura que clara que a ignorância?
- Certamente - respondeu.
- Situa-se entre uma e outra?
- Sim, situa.
- A opinião é, portanto, qualquer coisa de intermédio entre a ciência
e a ignorância.
- Absolutamente.
- Ora, não dissemos anteriormente que, se descobríssemos uma coisa que fosse e não fosse ao mesmo tempo, essa coisa ocuparia o meio entre o ser absoluto e o nada absoluto e não seria o objecto nem da ciência nem da ignorância, mas do que pareceria intermédio entre uma e outra?
- Dissemo-lo com razão.
- Mas parece agora que esse intermédio é o que denominamos opinião.
- Assim parece.
- Resta-nos, portanto, descobrir, julgo eu, que coisa é essa que participa ao mesmo tempo do ser e do não-ser e que não é exactamente nem um nem outro: se a descobrirmos, chamar-lhe-emos com justeza objecto da opinião, consignando os extremos aos extremos e os intermédios aos intermédios, não é assim?
- Sem dúvida.
- Por isto, que me responda, direi eu, esse bom homem que não acredita na beleza em si mesma, na ideia do belo eternamente imutável, mas reconhece apenas a multidão das coisas belas, esse amador de espectáculos que não suporta que se afirme que o belo é uno, assim como o justo e as outras realidades semelhantes. «Entre esse grande número de coisas belas, excelente homem», dir-lhe-emos, «Há uma que não possa parecer feia? ou, entre as justas, injusta? ou, entre as santas, profana?»
- Não, é forçoso que as mesmas coisas, de certa maneira, pareçam belas e feias, e assim por diante.
- E os numerosos dobros? Podem parecer menos metades do que dobros?
- De maneira nenhuma.
- Digo o mesmo quanto às coisas que se dizem grandes ou pequenas, pesadas ou leves; cada uma destas qualificações convém-lhes mais que a qualificação contrária?
- Não, participam sempre de uma e outra.
- Essas numerosas coisas são mais do que não são o que se diz que são?