Depois da reza saíram os convidados: os padres também saíram para rezar o breviário, o sargento-mor foi tomar um banho no rio e eu fiquei sozinho com Tomásia.
Coaxavam as rãs e zumbiam os besouros. Dos soutos e carvalheiras vinha o pio gemente das corujas e dos mochos. Os morcegos voejavam por entre os pilares da varanda. Nas cortes vizinhas da casa balavam os cordeiros, e refocilavam-se as cabras, produzindo o som cavo do embate das marradas - divertimento que a humanidade usa com menos estrondo e mais às claras.
Tomei a mão de Tomásia e disse-lhe:
- És muito minha amiga?
- Sou - respondeu ela, dando a outra mão, que eu apertei entre as minhas.
- És feliz em casar comigo?
- Agora é que tenho quanto desejo.
- E se eu não voltasse, se eu não casasse contigo, eras desgraçada?
- Deus me livre! Morria como a menina de Chaves.
- E se te dissessem que eu gostava de outra mulher, querias-me?
- Se o Sr. Silvestre gostasse de outra não me queria a mim.
- Mas se eu viesse a gostar depois de casado?
Tomásia retirou as mãos. Não sei se perdeu a cor, que era suficiente a claridade das estrelas para este estudo.
- Porque tiras as tuas mãos das minhas?! - perguntei.
Tomásia deu-as outra vez, sem responder.
Insisti na pergunta.
- Isso não pode ser - disse ela.
- O que não pode ser?
- Casar comigo e gostar de outra depois... O meu pai quis sempre muito a minha mãe, e todos os casados que conheço são como era o meu pai.
- E eu serei como eles, minha amiga. Não penses mais nestas perguntas.
Abracei-a, dei-lhe um beijo na face e deixei-a ir dar as ordens para a ceia.
O beijo recebeu-o sem estremecimentos de pudor, como as donzelinhas dos romances.
***
Dois dias depois, às seis horas da manhã, ouvi um tiroteio que vinha soando das montanhas e vales convizinhos da aldeia.