Deteve-se o homem a pensar, e respondeu:
- Rio da pouca ou nenhuma penetração da mocidade. Não se recorda de eu lhe ter dito que aquelas senhoras amavam toda a gente?
- E se o senhor se apaixonar?
- Apaixonado estou eu.
- Pois pior. Suponha agora que aquela mulher o menospreza e ridiculiza!
- Suicido-me!
- Isso é asneira, Sr. Silvestre! Olhe eu já amei Clotilde.
- Chama-se Clotilde?
- Chama. Que nome!, que poesia!, que lirismo!, não acha?
- Acho!... Clotilde! Há não sei quê das paixões sanguentas da Idade Média neste nome!... Clotilde! Que bem fadado nome! Tem magia!... Clotilde!... Então o senhor amou-a?
- Amei.
- E depois?
- Apaixonei-me. Pedi-lhe o coração exclusivo, e ela disse-me que o exclusivo do coração só o daria com o exclusivo da mão. Entende o fraseado?
- Perfeitissimamente. Queria dizer que só amaria exclusivamente o marido.
- É isso mesmo. Eu era menor, e o meu pai negava-me licença para casar. Clotilde era pobre, e eu, sem os benefícios do meu pai, era indigente: Tão inútil homem era eu que fazia versos, e que versos, ó santo Deus!
- E ela ama poesia?
- Gostava das décimas e embirrava com as odes. Fiz-lhe muita décima: estão todas impressas no Ramalhete. Vamos ao essencial. A paixão cegou-me. Clotilde, sabedora da repugnância do meu pai, parecia disposta a aproveitar o tempo com outro namoro. Suspeitei esta infernal resolução, e... que passo eu dei, Sr. Silvestre!... que passo!...
- Que passo deu o senhor?!
- Casei com ela!
- O quê?! - exclamei eu, varando de agulhadas nos olhos e nos ouvidos.
- Casei com Clotilde.
- Pois Clotilde é casada?...
- Comigo; há cinco anos, quatro meses e nove dias!
Dito isto, o empregado público, depois de uma gargalhada estridente, afetou a mais cómica das seriedades e continuou:
- O senhor não vá contar isso a ninguém, senão arrisca-se a dar mote para uma farsa, e lembre-se que o personagem mais ridículo dela será o Sr.