Os Pobres - Cap. 23: XXII - A filosofia do Gabiru Pág. 131 / 158

É singular a inconsciência com que o homem trata as coisas mais profundas da vida – e a gravidade com que discute as que são apenas aparências vás.

A desgraça é sempre boa – porque aproxima o homem dos desgraçados.

Tudo na vida se simplifica sendo a gente simples.

É com a folha que se deixa vogar na mansidão dum rio até que o oceano a traga.

Para se ser feliz na vida é preciso ser-se pobre.

Sentir-se que o pão que se come não é tirado a nenhuma boca, nem o lume que nos aquece roubado a alguma velhice friorenta.

Ser pobre, lavrar uma terra que nos dá o pão saboroso e negro e o tronco para o nosso lume!...

Quando se ama, a emoção sai de nós como duma fonte e a gente prende-se aos outros. Não se sente sozinha: faz parte da Vida, duma torrente de amor misteriosa e esplêndida. O amor torna-os irmãos.

O homem não faz senão complicar a vida, que em si é afinal bem simples.

As coisas desprezadas são as melhores da vida: a paz, as horas esquecidas, a água desnevada que se bebe, os minutos de silêncio em que se sente Deus connosco.

De que serve acumular ódios, ambições, riquezas?

Não é isto de mais para uma vida terrena?

Não saber nada senão amar – repartir emoção com os outros!

De rastros! de rastros! Ódio, ambição, gritos, tudo isso é nada! Toda a existência perdida a sonhar, a viver sozinho, absorto em coisas nulas, quando a vida é tão grande e tão simples e se reduz – a amar! Pelo amor conhece-se tudo, até o que os sábios ignoram. Olha para um mistério com amor, e ele desvenda-se logo; olha para um calhau com amor, que até nele encontras mil coisas imprevistas; chega-te ao homem, teu irmão, até ao mais degradado, com amor, que nele depararás com Deus.

Deus vive ao pé de ti, contigo, toca-lo a toda a hora.





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