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Capítulo 6: V - História do Gebo

Página 42
V - História do Gebo

Por fim, na entrada desse frio e rigoroso inverno, já tinha vendido tudo. De envelhecido e gasto, di-lo-eis um trapo que se deita fora ou um doido de cabelos brancos estacados, a falar sozinho. Toda a gente o conhecia.

– Ó Gebo!

– Anh?

A mulher azedara com a pobreza e passava horas e horas a chorar, atirada para um canto, ou pregava dias inteiros em monólogos cheios de gritos, de sonho espezinhado, todos lavados em lágrimas. Se tudo acabasse!... Mas nem a Morte escuta os desgraçados, nem o tempo se apressa; vai moendo na sua mó as tristezas, as aflições e o pão negro. O desespero daquela criatura caía em impropérios sobre a cabeça do Gebo espantado, a suar, e a quem nem a própria desgraça conseguia empedernir o coração.

Todos os dias eram da mesma forma sombrios e tristes. Isto de chorar um dia e outro dia dá a impressão de que chove e se não sai do inverno. Outras vezes calavam-se, mas a discussão era talvez maior, era talvez pior... Existência sem cor, que se gasta fio a fio, em que a desgraça se assemelha à desgraça, os gemidos se não ouvem, em que cada um para o seu lado interroga a vida e as horas passam acinzentadas deixando-os todos três curvados, todos três absortos. Porque a vida interior nunca cessa, nem no sono – este monólogo com que a vamos comentando até ao fim, que não tem existência real e que é vivo e imenso. Nos homens e nos bichos.

Talvez também nas árvores. Nuns desvairado, noutros humildes, baixinho, quase pueril. A vida não é senão este monólogo furioso ou ridículo e mais dorido quando é concentrado e sem gritos... Mas ela não podia mais e irrompia:

– Deste, emprestaste a toda a gente. E agora?

agora? Riem-se de ti inda por cima, e ninguém te ajuda.

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pág. 42 (Capítulo 6)

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Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 42

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154