Robinson Crusoe - Cap. 9: Capítulo 9 Pág. 152 / 241

Era o mês de Dezembro do ano vigésimo terceiro da minha reclusão, na época do solstício austral, pois não posso chamar-lhe solstício de Inverno; como era a estação da colheita, precisava de sair quase todos os dias. Uma manhã, pouco antes do nascer do sol, vi com surpresa na praia, a cerca de duas milhas do local em que me encontrava, o resplendor de uma grande fogueira para os lados da ponta da ilha onde notara as marcas dos selvagens, mas não na banda oposta e sim, com grande aflição minha, para o mesmo lado onde tinha a casa.

Ao vê-lo, apoderou-se de mim um tal espanto que me quedei imóvel, sem me atrever a sair do bosquezinho com medo de ser surpreendido, e ainda não me considerava descansado, pois temia que a colheita já segada, ou algumas das obras de agricultura, revelassem a um qualquer selvagem que divagasse pela ilha, que esta era habitada, e que então eles não descansassem até dar comigo. Com este receio refugiei-me na fortaleza, retirei a escada e dei a tudo um aspecto tão agreste e natural quanto me foi possível.

Fiz logo os meus preparativos de defesa. Carreguei todos os canhões, como chamava aos mosquetes montados nas novas fortificações, e todas as pistolas, decidido a dar luta ao inimigo até ao último extremo. Não me esqueci de invocar a Providência, rogando-lhe que me livrasse daqueles bárbaros; permaneci nesta posição cerca de duas horas, muito impaciente por saber o que se passava lá fora, pois não tinha nenhum espião para efectuar um reconhecimento.

Após uma larga indecisão sobre qual a atitude a tomar, não pude resistir ao desejo de descobrir alguma coisa; trepei a uma espécie de plataforma que havia em cima do penhasco, com o auxílio da escada, a qual recolhia à medida que ia subindo; alcancei, por fim, o cume. Então, recorrendo ao óculo de longo alcance, que tivera o cuidado de levar comigo, deitei-me de barriga para baixo e olhei na direcção da praia. Vi que ali estavam nada menos de nove selvagens nus, sentados à volta de uma fogueira, não para se aquecerem, pois fazia um calor excessivo, mas, como supunha, para prepararem um horrível festim de carne humana que deviam ter trazido.





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