Os Pobres - Cap. 8: VII - Primavera Pág. 57 / 158

– Tu?

– Sim.

– A mim minha mãe é que era a capa. Encobria-me.

E ninguém se importa com o Gabiru, que tece, vai tecendo a sua teia, toda de emoção e de nuvens, encolhido a um canto, absorto, sem ver nem ouvir:

– «Não sei bem o que sinto, que nunca me vi assim.

Do meu coração sai uma bica que rega as coisas mais secas. E ouço! o que ouço!... Ao luar, lá em cima, ouço as montanhas em diálogo e falarem árvores e pedras!...

E a tísica, voltada para o ladrão, diz-lhe:

– Que queres mais que te eu dê?

E ele, rindo:

– Ora! dinheiro...

– Nem pra pão já o tenho, quanto mais!... Já o não ganho. Quem me quer, se todos dizem que estou tísica?

Estarei...

– Tu arranjas sempre.

– Aonde? os meus trapos estão no prego, este xale é emprestado por misericórdia. O lenço que ontem trazia, vendi-o pra pagar à patroa. E amanhã entro para o Hospital.

Ele lentamente ergue-se para sair. Quase à porta murmura:

– Bem sei onde ir buscá-lo.

Magra, desconjuntada, a tossir, a tísica exclama:

– Pois vai! vai!... Se outras te dão mais, vai!...

Deixa-me!...

– Pois vou...

E logo ela, arrependida, torna:

– Espera. Dei-te tudo. Escuta... Tens sido como quê? com um filho meu... – E para as outras com um amargo sorriso: – Ó raparigas, quem há aí que me empreste algum dinheiro pelas almas?

Uma abaixa-se. De entre a meia e o sapato tira uma moeda, e a tísica, estendendo a mão:

– Já a não ganho com o meu corpo.

E beija as cruzes ao dinheiro.

– Toma.

Dá-lha e baixinho pede-lhe:

– Antes de eu morrer, prometes que me vais ver ao Hospital? Todos dizem que estou tísica. Não é por nada, mas vai-me custar morrer, sem ver ninguém ao pé de mim... Quem hei-de eu ver? Agora olha como te portas sozinho, ouviste? Inda te levam para o chilindró.





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