Os Pobres - Cap. 11: X - História do Gebo Pág. 68 / 158

Às vezes a mulher nem descansar o deixava; queria falar, discutir, ouvi-lo:

– Dormes como um porco! Fala, escuta-me!

E o Gebo, a pingar de sono, lá se punha a dizer palavras, coisas desnorteadas, até que ela enfurecida exclamava:

– Dorme! Fica-te para aí!...

Mas tinha de acordar e a caça aos magros cinco tostões, que todos os dias precisava de juntar, começara a ser desorientada e feroz. Viam-no correr, espreitar um conhecido de outrora, segui-lo, dizer-lhe a sua aflição em palavras desconexas, e depois muito baixinho pedir esmola. Ficava horas à porta duma loja, esse velho trôpego, com o casaco no fio remendado pela filha, à espera que um conhecido passasse. Às vezes consumiam-se os dias e ele sem dinheiro para pão – porque os corações são de pedra. Rondava num desespero pelas ruas. Não encontraria alguém que lhe valesse?

Despediam-no, e ele fazia-se mais humilde, sem ódios, pedinchão e sempre a suar, Já não tinha que pôr no prego e muitas vezes se lembrava da morte.

Ao chegar a casa, sufocado, pesado, a mulher, que o esperava num transe, perguntava ao avistá-lo:

– E então? então?

– Cá está, mulher! cá está!

Oh descansar, dormir na terra bem pesada, bem funda, para sempre fugir àquela fadiga de lágrimas, esquecer as humilhações, as horas amargas passadas atrás dos que outrora servira! ficar no derradeiro sono, de que nunca mais se acorda nem para a desgraça, nem para o escárnio!...

E nem na própria casa o Gebo descansava. Precisava mentir. Eram infindáveis os ralhos e os gritos. Só Sofia, pela sua resignação, lhe dava ânimo. Se não fosse ela, seria tão bom morrer!... Os seus amigos estavam ricos e secos como as pedras. Alguns nem sequer o viam:

riam-se outros dele e não lhe davam esmola.





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