Os Pobres - Cap. 13: XII - Filosofia do Gabiru Pág. 79 / 158

.. Abre-se de repente uma cova... Não se pensa mais, não se vê, não se ouve... E o que custa não é deixar pessoas queridas, nem hábitos – é não viver. Morrer quando a vida continua da mesma forma harmónica e impassível – eis o horror.

Nenhum outro homem no universo existe realmente para o homem; nenhuma outra vida senão a sua vida.

Ao chegar dos trinta anos abandonam-se os amigos. Se alguns restam é por hábito ou por interesse:

é por cálculo. Se queres continuar a amar os outros, afasta-te, torna-te solitário. Ou deixas de ser sincero e passas a morar com a mentira. A peleja começou: é preciso arredar, vencer – e cada um nessa idade é o que é. Já se não amolda: é um ferro desembainhado, saído da forja; tem já os seus hábitos, vaidade, mentiras. Tudo o que estava apenas esboçado endureceu; é de pedra.

De forma que se quiseres viver com os outros tens de representar.

Os que têm uma forte individualidade arredam-se, porque nunca podem agradar. O triunfo pertence não aos mais fortes, nem aos mais inteligentes, mas aos que, sem pessoalidade, podem ser todo o mundo...

Ser parecido lisonjeia: daí, tens de afivelar uma máscara igual à do homem que precisas conquistar.

Sim, a vida é uma tragédia esplêndida, com todos os seus crimes, sonhos, ódios. Falam em nos as montanhas, as árvores, as nuvens, e fala até, num murmúrio, o que é ainda desconhecido.

Que é preciso para que cada um se encontre? Que é preciso para que as árvores abaladas se carreguem de flor? A Primavera – a dor.

Tu és a mãe, terra; tu a fecundaste, dor, e até nós veio como o murmúrio apagado dos teus gritos.

Amo-te nos bichos, no sol, na luz, nas pedras; na terra onde mergulho as mãos até as enegrecer, na água que mas banha; no ar que respiro; no sonho; na morte; na desgraça; no que é humilde ou grande, não importa.





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