Cândido - Cap. 27: CAPÍTULO XXVII - Viagem de Cândido para Constantinopla Pág. 106 / 118

Havia na chusma dos forçados dois que remavam muito mal e a quem o patrão levantino batia de vez em quando com um chicote de nervo de boi nas espáduas nuas. Cândido, por um movimento natural, olhou com mais atenção para estes galerianos e aproximou-se deles com piedade. Certos traços dos seus rostos desfigurados pareceram-lhe ter alguma semelhança com os de Pangloss e do infeliz barão jesuíta, o irmão da menina Cunegundes. Esta ideia comoveu-o e entristeceu-o. Examinou-os com maior atenção e disse a Cacambo:

- A verdade é que, se eu não tivesse visto enforcar mestre

Pangloss e tido a infelicidade de matar o barão, diria que são eles que remam nesta galera.

Ao ouvirem falar no barão e em Pangloss, os dois forçados soltaram um grande grito e deixaram cair os remos.

O patrão levantino correu para eles e as vergalhadas redobraram. - Parai, parai, senhor! - gritou Cândido -, e dar-vos-ei quanto dinheiro quiserdes.

- O quê?, é Cândido! - dizia um dos forçados.

- O quê?, é Cândido! - dizia o outro.

- Será um sonho? - dizia Cândido. - Estarei acordado e nesta galera? Será o Sr. Barão, que eu matei, e mestre Pangloss, que eu vi enforcar?

- Somos nós próprios, somos nós próprios - responderam eles.

- O quê?! É este o grande filósofo? - perguntava Martin.

- Quanto quereis pelo resgate do Sr. De Thunder-ten-tronckh, um dos primeiros barões do império, e do Sr. Pangloss, o metafisico mais profundo da Alemanha?

- Cão de Cristão - respondeu o levantino -, visto estes dois vis forçados serem barões e metafísicos, o que é, sem dúvida, uma grande dignidade no seu país, dar-me-ás cinquenta mil cequins.

- Dar-vo-los-ei logo que chegarmos a Constantinopla.





Os capítulos deste livro

CAPÍTULO I - Como Cândido foi educado num belo castelo e porque dele foi expulso 1 CAPÍTULO II - O que aconteceu a Cândido entre os Búlgaros 4 CAPÍTULO III - Como Cândido se livrou dos Búlgaros e o que lhe aconteceu 7 CAPÍTULO IV - Como Cândido encontrou o seu antigo mestre de filosofia, o Dr. Pangloss, e o que lhe aconteceu 10 CAPÍTULO V - Tempestade, naufrágio, tremor de terra, e o que aconteceu ao Dr. Pangloss, a Cândido e ao anabaptista Tiago 14 CAPÍTULO VI - Como se fez um belo auto-de-fé para impedir os tremores de terra e como Cândido foi açoitado 18 CAPÍTULO VII - Como uma velha cuidou de Cândido e ele encontrou aquela que amava 20 CAPÍTULO VIII - História de Cunegundes 23 CAPÍTULO IX - O que aconteceu a Cunegundes, a Cândido, ao inquisidor-mor e ao judeu 27 CAPÍTULO X - Em que angústia Cândido, Cunegundes e a velha chegam a Cádis e como embarcaram 29 CAPÍTULO XI - História da velha 32 CAPÍTULO XII - Continuação da história das desgraças da velha 36 CAPÍTULO XIII - Como Cândido foi obrigado a separar-se da bela Cunegundes e da velha 40 CAPÍTULO XIV - Como Cândido e Cacambo foram recebidos entre os jesuítas do Paraguai 43 CAPÍTULO XV - Como Cândido matou o irmão da sua querida Cunegundes 47 CAPÍTULO XVI - O que aconteceu aos dois viajantes com duas raparigas, dois macacos e os selvagens chamados Orelhões 50 CAPÍTULO XVII - Chegada de Cândido e do seu criado ao país do Eldorado e o que aí Viram 54 CAPÍTULO XVIII - O que viram no país do Eldorado 58 CAPÍTULO XIX - O que lhes aconteceu em Suriname e como Cândido conheceu Martin 64 CAPÍTULO XX - O que aconteceu no mar a Cândido e a Martin 70 CAPÍTULO XXI - Cândido e Martin aproximam-se das costas de França e filosofam 73 CAPÍTULO XXII - O que aconteceu em França a Cândido e a Martin 75 CAPÍTULO XXIII - Cândido e Martin dirigem-se para as costas de Inglaterra e o que por lá vêem 87 CAPÍTULO XXIV - De Paquette e do Irmão Giroflée 89 CAPÍTULO XXV - Visita ao Sr. Pococuranté, nobre veneziano 94 CAPÍTULO XXVI - De uma ceia que Cândido e Martin tiveram com seis estrangeiros e quem eles eram 100 CAPÍTULO XXVII - Viagem de Cândido para Constantinopla 104 CAPÍTULO XXVIII - O que aconteceu a Cândido, Cunegundes, Pangloss, Martin, etc. 108 CAPÍTULO XXIX - Como Cândido reencontrou Cunegundes e a velha 111 CAPÍTULO XXX – Conclusão 113