CAPÍTULO XII - Continuação da história das desgraças da velha - Surpreendida e contente por ouvir a língua da minha pátria, e não menos admirada das palavras que aquele homem proferia, respondi-lhe que havia desgraças bem maiores do que aquela de que ele se queixava. Contei-lhe em poucas palavras os horrores que sofrera e voltei a desmaiar. Ele levou-me para uma casa vizinha, mandou que me deitassem na cama e me dessem de comer, serviu-me, consolou-me, lisonjeou-me, dizendo-me que nunca tinha visto mulher tão bela como eu, nem lastimar tanto como agora a falta de uma coisa que ninguém lhe podia restituir.
«‘ Nasci em Nápoles’, disse-me ele, ‘onde castram todos 85 anos dois ou três mil rapazes. Uns morrem, os outros adquirem uma voz mais bela que a das mulheres e outros, ainda, vão governar os Estados. Fizeram-me tal operação com bom resultado e fui músico da capela da princesa de Palestrina.’
«'- De minha mãe!', exclamei eu.
«‘- De vossa mãe!’, gritou ele, chorando. 'O quê? Seríeis vós aquela princesinha que eduquei até à idade de seis anos e que prometia já ser tão bela como agora vós sois?'
«'- Eu própria. Minha mãe está a quatrocentos passos daqui, feita em pedaços, debaixo de um monte de cadáveres... '
«Contei-lhe tudo o que me tinha acontecido. Ele contou-me também as suas aventuras, dizendo-me que tinha sido enviado ao rei de Marrocos por uma potência estrangeira, para concluir com este monarca um tratado por meio do qual ela lhe forneceria pólvora, canhões e navios para o ajudar a exterminar o comércio dos outros cristãos.
«‘- A minha missão está cumprida’, disse ele; 'vou embarcar para Ceuta e levar-vos-ei para Itália. Ma che sciagura d'essere d'senza c …!’
«Agradeci-lhe com lágrimas de enternecimento, mas ele, em vez de me levar para Itália, levou-me para Argel e vendeu-me ao bei daquela província.