Cândido - Cap. 3: CAPÍTULO III - Como Cândido se livrou dos Búlgaros e o que lhe aconteceu Pág. 7 / 118

CAPÍTULO III - Como Cândido se livrou dos Búlgaros e o que lhe aconteceu

Nada era mais belo, mais lesto, mais brilhante, melhor ordenado, do que os dois exércitos. As trombetas, os pífaros, os clarinetes, os tambores, os canhões, formavam uma harmonia como nunca se viu no Inferno. Os canhões deitaram abaixo, à primeira descarga, perto de seis mil homens de cada lado. Depois, a mosque teria eliminou do melhor dos mundos cerca de nove a dez mil patifes que infestavam a sua superfície. A baioneta foi também a razão suficiente da morte de alguns milhares de homens. O total de mortos podia calcular-se em trinta mil almas. Cândido, que tremia como um filósofo, escondeu-se o melhor que pôde durante esta carnificina heróica.

Enfim, enquanto os dois reis mandavam cantar tedéus, cada um no seu acampamento, ele tomou o partido de ir raciocinar para outro lado sobre causas e efeitos. Passou por cima de um monte de mortos e moribundos e dirigiu-se em primeiro lugar para uma aldeia vizinha. Estava em cinzas; era uma povoação árabe que os Búlgaros tinham incendiado, segundo as leis do direito público. Aqui, velhos crivados de feridas viam morrer as mulheres degoladas, que tinham os filhos aos peitos em sangue; além, raparigas esventradas exalavam os últimos suspiros depois de nelas terem saciado os seus apetites alguns heróis. Outras, meio queimadas, gritavam pedindo que as acabassem de matar. Massas encefálicas espalhavam-se pela terra, ao lado de braços e pernas cortadas.

Cândido fugiu o mais depressa que pôde para outra aldeia.

Pertencia aos Búlgaros e os heróis ábares tinham-na tratado da mesma maneira. Cândido, caminhando sempre sobre membros palpitantes ou através de ruínas, chegou enfim fora do teatro da guerra, levando algumas provisões na bolsa e não esquecendo nunca a menina Cunegundes.





Os capítulos deste livro

CAPÍTULO I - Como Cândido foi educado num belo castelo e porque dele foi expulso 1 CAPÍTULO II - O que aconteceu a Cândido entre os Búlgaros 4 CAPÍTULO III - Como Cândido se livrou dos Búlgaros e o que lhe aconteceu 7 CAPÍTULO IV - Como Cândido encontrou o seu antigo mestre de filosofia, o Dr. Pangloss, e o que lhe aconteceu 10 CAPÍTULO V - Tempestade, naufrágio, tremor de terra, e o que aconteceu ao Dr. Pangloss, a Cândido e ao anabaptista Tiago 14 CAPÍTULO VI - Como se fez um belo auto-de-fé para impedir os tremores de terra e como Cândido foi açoitado 18 CAPÍTULO VII - Como uma velha cuidou de Cândido e ele encontrou aquela que amava 20 CAPÍTULO VIII - História de Cunegundes 23 CAPÍTULO IX - O que aconteceu a Cunegundes, a Cândido, ao inquisidor-mor e ao judeu 27 CAPÍTULO X - Em que angústia Cândido, Cunegundes e a velha chegam a Cádis e como embarcaram 29 CAPÍTULO XI - História da velha 32 CAPÍTULO XII - Continuação da história das desgraças da velha 36 CAPÍTULO XIII - Como Cândido foi obrigado a separar-se da bela Cunegundes e da velha 40 CAPÍTULO XIV - Como Cândido e Cacambo foram recebidos entre os jesuítas do Paraguai 43 CAPÍTULO XV - Como Cândido matou o irmão da sua querida Cunegundes 47 CAPÍTULO XVI - O que aconteceu aos dois viajantes com duas raparigas, dois macacos e os selvagens chamados Orelhões 50 CAPÍTULO XVII - Chegada de Cândido e do seu criado ao país do Eldorado e o que aí Viram 54 CAPÍTULO XVIII - O que viram no país do Eldorado 58 CAPÍTULO XIX - O que lhes aconteceu em Suriname e como Cândido conheceu Martin 64 CAPÍTULO XX - O que aconteceu no mar a Cândido e a Martin 70 CAPÍTULO XXI - Cândido e Martin aproximam-se das costas de França e filosofam 73 CAPÍTULO XXII - O que aconteceu em França a Cândido e a Martin 75 CAPÍTULO XXIII - Cândido e Martin dirigem-se para as costas de Inglaterra e o que por lá vêem 87 CAPÍTULO XXIV - De Paquette e do Irmão Giroflée 89 CAPÍTULO XXV - Visita ao Sr. Pococuranté, nobre veneziano 94 CAPÍTULO XXVI - De uma ceia que Cândido e Martin tiveram com seis estrangeiros e quem eles eram 100 CAPÍTULO XXVII - Viagem de Cândido para Constantinopla 104 CAPÍTULO XXVIII - O que aconteceu a Cândido, Cunegundes, Pangloss, Martin, etc. 108 CAPÍTULO XXIX - Como Cândido reencontrou Cunegundes e a velha 111 CAPÍTULO XXX – Conclusão 113