O Vil Metal - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 21 / 257

Luzes acesas à meia hora. Faltavam quatro horas e três quartos para fechar. Cinco e um quarto para jantar. Dois pence e meio na algibeira. Não haveria tabaco, no dia seguinte.

De repente, acudiu-lhe um desejo irresistível defumar. Tomara a decisão de não consumir um único cigarro naquela tarde. Só lhe restavam quatro. Tinha de os reservar para a noite, em que tencionava «escrever», pois sentia-se tão impossibilitado de' traçar uma única linha sem tabaco como sem respirar. Não obstante, necessitava de fumar. Puxou do maço de Pleyer's Weights e extraiu um dos pequenos cigarros. Tratava-se de indulgência estúpida, pura e simples, e representava a supressão do tempo de «escrita» daquela noite no equivalente a meia hora. Mas não lhe podia resistir. Chupou o fumo calmante para os pulmões com uma espécie de prazer pecaminoso.

A imagem do seu rosto olhou-o com impassibilidade de vidraça cimentada. Gordon Comstock, autor de Ratos; en l’na trentième de son âge, e já carcomido pelo tempo. Restavam-lhe apenas vinte e seis dentes. Não obstante, François Villon, na mesma idade, era sifilítico. No fundo, devia sentir-se grato pelas pequenas dádivas.

Olhou o pedaço de cartaz solto agitado pelo vento no anúncio do Molho Q. T. A nossa civilização está moribunda. Tem de estar. Mas não morrerá na cama. Vêm aí os aviões. Zum... uizzz... bum! Todo o mundo ocidental pelos ares num turbilhão de potentes explosivos.

Olhou a rua imersa em escuridão crescente, a sua imagem cinzenta na vidraça, os vultos imprecisos que passavam. Repetiu quase involuntariamente:

C'est l'Ennui - l'oeil chargé d'un pleur involonteire,

Il rêve d’échafaude en fumant son houka!

Dinheiro, dinheiro! Mesa do Canto! O zumbido dos aviões e o deflagrar das bombas.

Gordon semicerrou as pálpebras para observar o céu plúmbeo. Os aviões vêm aí. Imaginou-os a seguir naquele' momento - esquadrilha após esquadrilha, incontáveis, a escurecerem o firmamento corno nuvens de gafanhotos. Com a língua não totalmente pousada nos dentes, produziu um som de zumbido de mosca varejeira num vidro para representar o dos aviões. Era um som que ele desejava ardentemente ouvir naquele momento.





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