Cândido - Cap. 22: CAPÍTULO XXII - O que aconteceu em França a Cândido e a Martin Pág. 78 / 118

- Quem era - perguntou Cândido - aquele grande idiota que me disse tanto mal da peça que me fez chorar e cujos actores tanto me agradaram?

- É um pelintra - respondeu o abade - que ganha a vida a dizer mal de todas as peças e de todos os livros. Inveja os que triunfam como os eunucos invejam os homens viris. É uma das serpentes da literatura que se alimentam de veneno e de imundície, a que chamam foliculários.

- E que entendeis vós por foliculário? - disse Cândido.

- Ora - respondeu o abade -, é um homem que escreve nas folhas. Um Fréron (Publicista Francês, fundador de uma revista literária).

Assim conversavam Cândido; Martin e o abade, na escadaria enquanto as pessoas saíam do teatro.

- Embora esteja ansioso por voltar a ver a menina - disse Cândido -, gostaria de cear com a menina Clairon, pois pareceu-me admirável.

O abade não era pessoa para se aproximar da menina Clairon, pois só se dava com pessoas de categoria, e ela era apenas uma actriz. Por isso, disse a Cândido:

- Ela está comprometida para esta noite, mas poderei levar-vos a casa de uma senhora muito distinta e onde começareis a conhecer Paris como se aqui vivêsseis há quatro anos.

Cândido, que era naturalmente curioso, deixou-se conduzir a casa da dama, ao fundo do bairro de Saint-Honoré. Jogava-se o faraó (jogo de cartas). Viam-se doze tristes jogadores, cada um com um baralho de cartas na mão, registo anguloso dos seus infortúnios. Reinava um silêncio profundo, via-se a palidez na fronte dos pontos e a inquietação na do banqueiro. A dona da casa, sentada junto deste, observava com olhos de lince todas as paradas, todas as jogadas e manigâncias dos jogadores, avisando-os com uma atenção severa, mas polida, e nunca se zangava, com medo de perder os fregueses.





Os capítulos deste livro

CAPÍTULO I - Como Cândido foi educado num belo castelo e porque dele foi expulso 1 CAPÍTULO II - O que aconteceu a Cândido entre os Búlgaros 4 CAPÍTULO III - Como Cândido se livrou dos Búlgaros e o que lhe aconteceu 7 CAPÍTULO IV - Como Cândido encontrou o seu antigo mestre de filosofia, o Dr. Pangloss, e o que lhe aconteceu 10 CAPÍTULO V - Tempestade, naufrágio, tremor de terra, e o que aconteceu ao Dr. Pangloss, a Cândido e ao anabaptista Tiago 14 CAPÍTULO VI - Como se fez um belo auto-de-fé para impedir os tremores de terra e como Cândido foi açoitado 18 CAPÍTULO VII - Como uma velha cuidou de Cândido e ele encontrou aquela que amava 20 CAPÍTULO VIII - História de Cunegundes 23 CAPÍTULO IX - O que aconteceu a Cunegundes, a Cândido, ao inquisidor-mor e ao judeu 27 CAPÍTULO X - Em que angústia Cândido, Cunegundes e a velha chegam a Cádis e como embarcaram 29 CAPÍTULO XI - História da velha 32 CAPÍTULO XII - Continuação da história das desgraças da velha 36 CAPÍTULO XIII - Como Cândido foi obrigado a separar-se da bela Cunegundes e da velha 40 CAPÍTULO XIV - Como Cândido e Cacambo foram recebidos entre os jesuítas do Paraguai 43 CAPÍTULO XV - Como Cândido matou o irmão da sua querida Cunegundes 47 CAPÍTULO XVI - O que aconteceu aos dois viajantes com duas raparigas, dois macacos e os selvagens chamados Orelhões 50 CAPÍTULO XVII - Chegada de Cândido e do seu criado ao país do Eldorado e o que aí Viram 54 CAPÍTULO XVIII - O que viram no país do Eldorado 58 CAPÍTULO XIX - O que lhes aconteceu em Suriname e como Cândido conheceu Martin 64 CAPÍTULO XX - O que aconteceu no mar a Cândido e a Martin 70 CAPÍTULO XXI - Cândido e Martin aproximam-se das costas de França e filosofam 73 CAPÍTULO XXII - O que aconteceu em França a Cândido e a Martin 75 CAPÍTULO XXIII - Cândido e Martin dirigem-se para as costas de Inglaterra e o que por lá vêem 87 CAPÍTULO XXIV - De Paquette e do Irmão Giroflée 89 CAPÍTULO XXV - Visita ao Sr. Pococuranté, nobre veneziano 94 CAPÍTULO XXVI - De uma ceia que Cândido e Martin tiveram com seis estrangeiros e quem eles eram 100 CAPÍTULO XXVII - Viagem de Cândido para Constantinopla 104 CAPÍTULO XXVIII - O que aconteceu a Cândido, Cunegundes, Pangloss, Martin, etc. 108 CAPÍTULO XXIX - Como Cândido reencontrou Cunegundes e a velha 111 CAPÍTULO XXX – Conclusão 113