Robinson Crusoe - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 108 / 241

Espero que o leitor não se surpreenderá quando lhe disser que todas estas ocupações empregaram a maior parte do terceiro ano; é que deve considerar que, além desses trabalhos, tinha de cuidar do labor do campo e da colheita; com efeito, nesse intervalo, segava e transportava as espigas para minha casa, a fim de guardá-las nas grandes domas e debulhá-las devagar com as mãos, porque me faltavam eira e mangual.

Entretanto, a minha provisão de grãos tinha subido muito, e tive necessidade de aumentar os celeiros, porque a colheita fora tão abundante que me deu, pelo menos, vinte fangas de cevada e outras tantas de arroz. Decidi-me, por conseguinte, a fazer uso dela sem limitações, pois a reserva de pão tinha-se esgotado, e quis também ver que quantidade de grão chegaria para o consumo de um ano, a fim de não semear mais do que uma vez.

Calculei que quarenta fangas me chegariam e ainda sobrariam; resolvi, assim, semear todos os anos a mesma quantidade que da última vez, esperando deste modo ficar completamente fornecido de pão.

No meio de todas estas ocupações, não olvidava a descoberta que fizera da terra situada no outro lado da minha ilha; não podia dirigir a vista para aquela banda sem desejar ir visitá-la porque, julgando que fosse um continente desabitado, imaginei que dali poderia passar para outra terra, na qual talvez encontrasse algum meio para sair da minha miséria.

Enquanto assim raciocinava, perdia de vista os perigos de uma empresa tão árdua, particularmente se fosse descoberto pelos selvagens, que deveria considerar, com mais razão, piores do que os tigres e leões de África, visto que se lhes caísse entre as mãos seria certamente assassinado e devorado. Sabia, com efeito, que os habitantes das Caraíbas são antropófagos, e reconhecia pela latitude em que me achava que não devia estar muito longe das suas terras. Mas supondo que aqueles povos não fossem antropófagos, corria, mesmo assim, o perigo de ser assassinado como sucedera a muitos europeus que tinham caído nas suas mãos, ainda que o seu número ascendesse a dez ou a vinte, e muito mais eu, que estava sozinho e não podia opor a mínima resistência.





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