Durante uns segundos, Winston sentiu-se tão paralisado que não pôde se mexer. Depois virou para a direita e saiu com passos tardos, sem notar que tomara a direção errada. De qualquer maneira, uma questão se esclarecera. Não podia mais haver dúvida de que a moça o estava espionando. Devia tê-lo seguido até lá, porque não era crível que por puro acaso fosse passear a mesma noite pela mesma rua obscura, a quilómetros de distância de qualquer bairro habitado por membros do Partido. Era demasiada coincidência. Pouco importava que pertencesse à Polícia do Pensamento, ou que fosse mera espiã amadora, impelida pelo desejo de fazer média. Provavelmente, vira-o também entrar no bar.
Andar era um esforço. A cada passo, o peso de cristal no bolso lhe batia na coxa, e ele teve ganas de jogá-lo fora.
O pior de tudo era a dor de barriga. Durante uns dois minutos, teve a impressão de que morreria se não fosse logo à privada. Mas não devia haver gabinetes públicos num bairro daqueles. Felizmente, o espasmo passou, deixando em seu lugar uma dor surda.
A rua era um beco sem saída. Winston parou, ficou uns segundos pensando no que fazer, depois deu meia-volta e regressou. Ao se voltar, ocorreu-lhe que como a moça cruzara por ele uns três minutos antes, haveria de alcançá-la, provavelmente. Poderia segui-la até um lugar ermo, e então esmigalhar-lhe o crânio com um paralelepípedo. O peso de papel seria suficiente para isso. Mas ele abandonou imediatamente o plano, porque era insuportável a simples ideia do esforço físico.