Capítulo XXIII O Café Castanheira estava quase vazio. Um raio de sol, entrando oblíquo pela janela, caía amarelo sobre as mesas poeirentas. Era a solitária hora das quinze. Das teletelas escorria uma música metálica.
Winston sentou-se no seu recanto habitual, olhando o copo vazio. De vez em quando contemplava um rosto enorme que o olhava da parede oposta. O GRANDE IRMÃO ZELA POR TI, dizia a legenda. Sem que o chamasse, o empregado veio e encheu-lhe o copo de Gin Vitória, pingando algumas gotas de outra garrafa com um canudinho atravessando a rolha. Era sacarina com essência de cravo, a especialidade do café.
Winston escutava a teletela. No momento, dela apenas saía música, mas havia a possibilidade de a qualquer momento divulgar um boletim do Ministério da Paz. As notícias da frente africana eram extremamente inquietadoras. O dia todo sentira-se intermitentemente preocupado com elas. Um exército eurasiano (a Oceania estava em guerra com a Eurásia: sempre estivera em guerra com a Eurásia) progredia para o sul com terrível velocidade. O boletim do meio-dia não mencionara nenhuma área definida, mas era provável que a foz do Congo já fosse um campo de batalha. Brazzaville e Leopoldville estavam em perigo. Não era preciso olhar o mapa para saber o que significava. Não era apenas questão de perder a África Central: pela primeira vez em toda a guerra, o território da Oceania estava ameaçado. Uma violenta emoção, que não era bem medo, mas uma espécie de excitação amorfa, se acendeu dentro dele, e tornou a apagar-se. Deixou de pensar na guerra. Não podia fixar o pensamento em assunto algum por mais de uns momentos. Ergueu o copo e tragou o conteúdo de um gole.