O membro do Partido não só deve ter as opiniões certas, como os instintos certos. Muitas das crenças e atitudes dele exigidas não são nunca declaradas abertamente, e não poderiam ser esmiuçadas sem pôr a nu as contradições inerentes do Ingsoc. Se for uma pessoa naturalmente ortodoxa (em Novilíngua bempensante), saberá, em todas as circunstâncias, sem precisar raciocinar, qual é a verdadeira crença e a emoção desejável. Mas, de qualquer maneira, um trabalhoso treino mental, a que se submeteu na infância, e que gira em torno das palavras novilinguísticas crimedeter, negrobranco e duplipensar, faz com que ele não tenha nem disposição nem capacidade para pensar a fundo em coisa alguma. Espera-se que o membro do Partido não tenha emoções pessoais nem lapsos de entusiasmo. Supõe-se que viva num frenesi contínuo de ódio aos inimigos estrangeiros e aos traidores internos, de gozo ante as vitórias e de autodegradação perante o poderio e a sabedoria do Partido. Os descontentamentos produzidos por essa vida nua e insatisfatória são deliberadamente purgados e dissipados por estratagemas tais como os Dois Minutos de ódio, e as especulações que poderiam vir a induzir uma atitude de ceticismo ou de rebeldia são antecipadamente suprimidas pela disciplina aprendida na infância. O primeiro e mais simples estágio dessa disciplina, e pelo qual passam até as crianças de tenra idade, chama-se, em Novilíngua, crimedeter. Crimedeter é a faculdade de deter, de paralisar, como por instinto, no limiar, qualquer pensamento perigoso. Inclui o poder de não perceber analogias, de não conseguir observar erros de lógica, de não compreender os argumentos mais simples e hostis ao Ingsoc, e de se aborrecer ou enojar por qualquer trem de pensamentos que possa tomar rumo herético.