A fotografia era mais ou menos assim. Um recorte retangular de jornal aparecera entre os dedos de O'Brien. Durante cinco segundos talvez ficou ao alcance da visão de Winston. Era uma fotografia, e não havia dúvidas quanto à sua identidade. Era a fotografia. Era outro exemplar da foto de Jones, Aaronson e Rutherford numa função do Partido em Nova York, a mesma que por acaso tivera em mãos, onze anos atrás, e destruíra quase imediatamente. Por um instante apenas teve-a diante dos olhos, depois tornou a sumir. Mas vira-a, não havia dúvida de que a vira! Fez um esforço desesperado, agoniado, de libertar o tórax e a cabeça. Era impossível mexer-se em qualquer direção, um centímetro que fosse. Por um momento, chegara a esquecer-se do mostrador. Tudo que queria era segurar de novo a fotografia, ou pelo menos vê-la.
- Existe! - exclamou.
- Não, - disse O'Brien.
Atravessou a sala. Na parede oposta havia um buraco da memória. Ele levantou a grade. Sem que o vissem, o frágil pedaço de papel foi sugado pela corrente de ar quente; desapareceria numa labareda. O'Brien voltou-se.
- Cinza - disse.
- Nem mesmo cinza identificável. Pó. Não existe. Nunca existiu.
- Mas existiu! Existe! Existe na memória. Eu me lembro.