- Permites que te ofereça um gole?
- O senhor é um cavalheiro - disse o outro, tornando a endireitar os ombros. Não parecia ter notado o macacão azul de Winston.
- Uma pinta! - acrescentou, agressivo, dirigindo-se ao botequineiro. - Uma pinta da boa!
O taverneiro serviu dois meios-litros de cerveja marron escura em canecas que enxaguara num balde debaixo do balcão. Nos bares dos proles só se podia tomar cerveja. Não lhes era permitido tomar gin, conquanto, na prática, fosse facílimo arranjá-lo. O jogo das flechinhas se reanimara, e os homens encostados ao balcão, haviam reiniciado a conversa sobre a Loteria. Por um momento, fora esquecida a presença de Winston. Debaixo da janela havia uma mesa junto à qual podia conversar à vontade com o velho. Era um perigo horrível, mas pelo menos não havia teletela no salão, o que verificara logo ao entrar.
- Ele bem que podia me serví uma pinta, - queixou-se o velho, sentando. - Meio litro não chega. Não satisfais. E um litro é muito. Me faz a bixiga trabalhá. E o preço!?
- Deves ter visto muita coisa mudar, desde mocinho - começou Winston, experimentando. Os olhos azul pálido do homem percorreram o bar do alvo das flechas ao balcão, do balcão à porta dos "Homens" como se as mudanças tivessem ocorrido ali mesmo.
- A cerveja era mió - disse por fim. - E mais barata! Quando eu era moço, cerveja clara - da boa - custava quatro dinheiros a pinta. Isso antes da guerra, naturalmente.
- Que guerra? - indagou Winston.
- De todas as guerras - respondeu o velho, vagamente. Levantou o copo e tornou a endireitar os ombros. - Com os meus mió voto de saúde e filicidade.
No pescoço magro o pomo de Adão, muito pontudo, fez um rapidíssimo movimento de subir e descer, e a cerveja sumiu.