As memórias de Sherlock Holmes - Cap. 4: A Tragédia do Glória Scott Pág. 94 / 274

Havia compartimentos em redor, e Wilson, o capelão simulado, arrombou um deles e de lá tirou uma dúzia de garrafas de vinho de Xerez. Quebrámos os gargalos das garrafas, enchemos as canecas e, no momento exacto em que nos levantávamos em sinal de regozijo, num instante, sem advertência, chegou-nos aos ouvidos o troar de mosquetões, e o salão encheu-se tanto de fumaça que não podíamos ver o outro lado da mesa. Quando clareou outra vez, a sala parecia um matadouro. Wilson e mais oito homens retorciam-se uns sobre outros no soalho, e a visão do sangue e do Xerez tinto em cima daquela mesa ainda me arrepia quando penso neles. Ficámos tão acobardados com o que víamos que creio que teríamos abandonado a luta se não fosse Prendergast. Ele berrou como um touro e precipitou-se para a porta com todos os que tinham ficado vivos atrás de si. Corremos para fora e na popa estava o tenente com dez homens. A luz dos astros abriu uma clareira e eles alvejaram-nos. Atirámo-nos a eles antes que pudessem carregar; bateram-se como homens, mas prevalecemos e em cinco minutos estava tudo acabado.

Meu Deus! Já terá havido um matadouro como aquele navio? Prendergast rugia como um demónio e, agarrando os soldados como se fossem crianças, lançava-os ao mar, vivos ou mortos. Havia um sargento terrivelmente ferido e mesmo assim nadou duramente longo tempo, até que alguém, num acto de misericórdia, lhe fez saltar os miolos. Quando a luta cessou, não havia mais nenhum inimigo, excepto os carcereiros, os pilotos e o médico.

Foi por causa deles que se deu a discórdia. Havia muitos que já estavam bastante alegres com a conquista da liberdade e que não tinham o menor desejo de serem assassinos. Uma coisa era abater soldados de mosquetões em punho, outra era ser conivente com uma matança a sangue-frio.





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