Eurico, o Presbítero - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 113 / 186

Mas Hermengarda só vira afronta e opróbrio nas palavras do amir, e o ódio a este homem, cuja natural fereza e orgulho o amor convertera em brandura e, talvez, em submissão, tornou-se ainda maior ao ouvi-lo. Recobrando toda a energia da sua alma, que por um momento vacilara, respondeu, olhando para Abdulaziz com ar de desprezo:

— Nem sempre os valentes conquistadores da Espanha podem achar traidores que vendam por ouro e honras infames os sepulcros de seus pais e os altares do Senhor. Não! Pelágio não aceitará nunca um lugar entre os filhos de Vitiza e o conde de Septum; porque Deus o guarda para vingador de seus traídos irmãos. Infiel, grande era o preço que davas por uma filha da serva raça dos godos: guarda-o para o empregares melhor: para comprares as livres e nobres donzelas do teu país. Tudo o que me ofereces é vil; porque vem de ti, maldito. Só uma oferta te aceito; há muito que ta pedi: a morte... a morte, e que seja breve. Abomino-te, destruidor da Espanha... Não!... Enganei-me. Desprezo-te, salteador do deserto.

Com os lábios brancos e o olhar desorientado, o amir ouvia as palavras de Hermengarda, e a sua fronte enrugava-se como a face do oceano ao passar do furacão. Tremendo silêncio reinou por alguns momentos na tenda. Com um rir abafado e diabólico, o amir o rompeu por fim:

— A morte? Não terás a morte: juro-to pelo sepulcro do profeta. Porque a abelha zumbiu aos ouvidos do caçador faminto, arrojará ele para longe o mel do seu favo e esmagará o insecto? Tu serás minha, mulher orgulhosa; porque o meu amor é, como o meu ódio, inexorável e fatal. Depois, quando o incêndio que me devora estiver extinto; quando o tédio morar para mim nos teus braços, irás cevar nas tendas dos bereberes a sensualidade brutal dessa soldadesca selvagem. Pode ser que teu nobre irmão venha entretanto salvar- -te... Guarda para então as soberbas; que hoje, pobre escrava, só te resta obedecer à voz do teu senhor.





Os capítulos deste livro