Os socorros dados imediatamente a Abdulaziz tinham-lhe restituído o sentimento da vida. O clarão da sua tenda, que ainda ardia a poucos passos do lugar para onde o haviam transportado, foi a primeira cousa que lhe feriu a vista ao descerrar os olhos do letargo em que estivera submerso. Esse facho desmesurado, cujo foco vermelho lhe aparecia coberto de vasta cúpula de fumo negro, o crepitar do incêndio, o rumor e alarido do arraial e a inquietação que se lia nos gestos dos que o rodeavam retraçaram-lhe subitamente no espírito a cena que se passara, pouco antes, naquele pavilhão incendiado. Era um quadro complexo e terrível: e o primeiro sinal de vida que o amir deu foi um grito de horror e desesperação. Alçando violentamente o corpo, ficou assentado sobre o almatrá em que estava deitado. Com o rosto lívido e tinto do sangue que lhe corria da fronte e o olhar espantado e feroz, hesitar-se-ia, ao vê-lo, em resolver se esse vulto era o de homem vivo, se o de morto que, afastando o sudário, se fosse a erguer da cova para revelar algum dos temerosos mistérios que encerra a aparente quietação do sepulcro. Parecia que o aspecto do amir convertera em estátuas todos os circunstantes: a imobilidade era completa, e o silêncio profundo.
Mas uma e outra cousa duraram apenas rápido instante. Com a voz rouca e afogada, o árabe rugia:
— Segui-o! segui o infiel!... As suas armas são negras e semelhantes às dos guerreiros de Al-Sudan... A melhor cidade do Gharb e a mais bela das minhas escravas a quem mo trouxer vivo aqui. Todos!... Ide, trazei-mo vivo! Prestes, xeiques, vális, caides, cavaleiros do profeta! Prestes! correi após o meu assassino!
As palavras de Abdulaziz revelavam o delírio da sua alma; xeiques, vális e caides olharam tristemente uns para os outros e não fizeram um único movimento.