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Capítulo 10: Capítulo 10

Página 55

O Sol ia já em alto quando o grito de «Allah hu Acbar!» soou no centro dos esquadrões do Islame. Era a voz sonora e retumbante de Táriq. Repetido por milhares de bocas, este grito restrugiu e ecoou, como o estourar de trovoada distante, pelos pendores das serras e murmurou e perdeu-se pelos desfiladeiros e vales. A cavalaria árabe, enristando as lanças, arremessou-se pela planície e desapareceu num turbilhão de pó.

— Cristo e avante! — bradaram os godos: e os esquadrões de Roderico precipitaram-se ao encontro dos muçulmanos. São como dois bulcões enovelados, que, em vez de correrem pela atmosfera nas asas da procela, rolam na terra, que parece tremer e vergar debaixo do peso daquela tempestade de homens. O ruído abafado e bem distinto do mover dos dois exércitos vai-se gradualmente confundindo num som único, ao passo que o chão intermédio se embebe debaixo dos pés dos cavalos. Essa distância entre as duas muralhas de ferro estreita-se, estreita-se! É apenas uma faixa tortuosa lançada entre as duas nuvens de pó. Desapareceu! Como o estourar do rolo de mar encapelado, tombando de súbito sobre os alcantis de extensas ribas, as lanças cruzadas ferem quase a um tempo nos escudos, nos arneses, nos capacetes. Um longo gemido, assonância horrenda de mil gemidos, sobreleva ao som cavo que tiram as armaduras batendo na terra. Baralham-se as extensas fileiras: cruzam- -nas espantados os ginetes sem donos, nitrindo de terror e de cólera, com as crinas erriçadas e respirando um alento fumegante. Não se distingue naquele oceano agitado mais que o afuzilar trémulo das espadas, o relampaguear rápido dos franquisques, o cintilar passageiro dos elmos de bronze; não se ouve senão o tinir do ferro no ferro e um concerto diabólico de blasfémias, de pragas, de injúrias em romano e em árabe, inteligíveis para aqueles a quem são dirigidas, não pelos sons articulados, mas pelos gestos de ódio e desesperação dos que as proferem. De vez em quando, um brado retumba por cima do estrupido: são os capitães que buscam ordenar as batalhas. Debalde! As fileiras têm rareado: o combate converteu-se num duelo imenso ou, antes, em milhares de duelos. Cada cavaleiro árabe travou- se com um cavaleiro godo, e os dois contendores esquecem-se de tudo quanto os rodeia: são dois inimigos, cujo ódio nasceu e encaneceu num momento, e num momento esse rancor é intenso quanto o fora, se por largos dias se acumulara sem poder resfolegar.

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Capa do livro Eurico, o Presbítero
Páginas: 186
Página atual: 55

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 4
Capítulo 3 7
Capítulo 4 12
Capítulo 5 18
Capítulo 6 22
Capítulo 7 28
Capítulo 8 32
Capítulo 9 46
Capítulo 10 55
Capítulo 11 63
Capítulo 12 71
Capítulo 13 90
Capítulo 14 105
Capítulo 15 121
Capítulo 16 134
Capítulo 17 148
Capítulo 18 158
Capítulo 19 171
Capítulo 20 176