Robinson Crusoe - Cap. 9: Capítulo 9 Pág. 165 / 241

Pareceu-me ver no meu sonho que ele se refugiava no espesso arvoredo que ocultava as minhas fortificações; depois, vendo que estava só e que não o perseguiam, mostrei-me, sorrindo para que se aproximasse; então deitou-se-me aos pés, como que a suplicar que o socorresse; mostrei-lhe a escada, fi-lo subir, em 'seguida conduzi-o à adega e chegou a tornar-se meu criado. Depois disse para comigo:

- Com este homem, quem me impede de me arriscar pelo oceano? Este companheiro poderá servir-me de piloto, indicar-me o que há a fazer, os sítios onde encontrarei provisões e aqueles em que estarei em perigo de ser devorado; enfim, dirigir-me para uns e afastar-me dos outros.

Despertei com esta ideia, e a impressão de alegria que me causara a perspectiva da minha liberdade era tão viva que, quando reconheci que tudo não passara de um sonho, caí num abatimento extraordinário. No entanto, este sonho fez-me compreender que O' único meio de o meu projecto de evasão obter êxito, era ter ao meu dispor um selvagem, sobretudo um prisioneiro condenado a ser comido e conduzido para a ilha com esse fim. Mas uma dificuldade se apresentava: o meu projecto não poderia executar-se enquanto não me arriscasse a atacar um grupo e a destruí-lo todo; tentativa desesperada que poderia sair facilmente gorada. Por outro lado, tinha examinado escrupulosamente a legalidade desse acto, e repugnava-me muito derramar tanto sangue, embora fosse para me salvar. Não quero repetir as objecções a este projecto porque já as disse mais acima, apesar de ter outras coisas a meu favor: aqueles homens eram meus inimigos e devorar-me-iam se pudessem fazê-lo; seria, pois, trabalhar para a minha sobrevivência procurar os meios de sair daquela situação, pior do que a própria morte; seria trabalhar pela minha defesa, tal como se realmente me atacassem. Embora todas estas razões falassem a meu favor, não podia suportar a ideia de derramar sangue humano com o fim de me proporcionar a liberdade.





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