Robinson Crusoe - Cap. 10: Capítulo 10 Pág. 185 / 241

Olhou-me estupefacto perante esta pergunta, sem dúvida porque a canoa lhe parecia pequena para tal viagem. Também lhe disse que tinha uma maior e, no dia seguinte, levei-o ao local onde estava a primeira canoa que fizera, e que não fora capaz de transportar para a água. Achou-a de bom tamanho mas como não tivera nenhum cuidado com ela, e ficara naquele sítio a bagatela de vinte e dois ou vinte e três anos, o sol tinha-a de tal modo ressequido e rachado que estava quase reduzida a pó. Sexta-Feira garantiu-me que uma canoa igual chegaria e poderia conter, como ele dizia, bastantes víveres «de beber e pão».

Uma tal segurança cimentou de tal modo a minha resolução que lhe disse que só nos faltava fazer uma igual a fim dele poder tornar à sua terra. Não replicou nada, mas pôs-se muito sério. Perguntei-lhe o que tinha e respondeu:

- Porquê zangar com Sexta-Feira? Que ter eu feito, que ter eu feito?!

Interroguei-o sobre o que aquilo significava, e assegurei-lhe que não cometera nenhuma inconveniência.

- Nenhuma inconveniência? - replicou repetindo estas palavras muitas vezes.

- Porquê enviar Sexta-Feira minha nação?

- Essa agora! Então não disseste que desejavas regressar?

- Sim - respondeu -, desejar os dois lá. Não querer Sexta-Feira lá e meu amo cá.

Numa palavra, não queria ouvir falar em partir sem mim.

- Vamos a ver, Sexta-Feira, que iria eu lá fazer? Ele replicou vivamente:

- Senhor fazer muito bem! Senhor ensinar homens selvagens ser homens bons, sábios, homens domesticados, mostrar desconhecer Deus, orar Deus e viver nova vida.

- Ah!, Sexta-Feira, não sabes o que dizes! Não passo de um ignorante.

- Sim, sim, senhor ensinar eu bem. Senhor ensinar eles bem.

- Não, não - continuei -, tu partirás sozinho, Sexta-Feira. Vais deixar-me viver aqui nesta solidão como dantes.

Pareceu novamente aterrado com estas palavras; depois, pegando no pequeno machado que levava habitualmente, apresentou-mo com vivacidade.

- Que queres que faça? - disse-lhe.

- Senhor matar Sexta-Feira.

- E porquê matá-lo?

- E porquê enviar Sexta-Feira longe, fora? Senhor matar Sexta-Feira! Não enviar Sexta-Feira.





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