1984 - Cap. 7: Capítulo VII Pág. 75 / 309

O puritanismo sexual do Partido não lhes era imposto. A promiscuidade não era punida, e o divórcio era permitido. Nesse particular, até a adoração religiosa teria sido permitida se os proles demonstrassem algum sintoma de desejá-la ou dela carecerem. Ninguém desconfiava deles. Como dizia o lema do Partido: "Os proles e os animais são livres."

Winston esticou o braço e coçou cautelosamente a variz ulcerada. Começara a comichar de novo. O que sobrevinha invariavelmente era a impossibilidade de saber como de fato fora a vida antes da Revolução. Tirou da gaveta um livro escolar de história, que tomara emprestado à Sra. Parsons, e pôs-se a copiar um trecho no diário:

Antigamente (dizia), antes da gloriosa Revolução, Londres não era a bela cidade que hoje conhecemos. Era um lugar escuro, sujo, miserável, onde pouca gente tinha bastante que comer e onde centenas e milhares de pobres não tinham calçado nem abrigo onde dormir. Crianças de mais ou menos a tua idade tinham de trabalhar doze horas por dia, para patrões cruéis, que as castigavam com chicotes quando trabalhavam muito devagar e não lhes davam senão côdeas de pão velho e água. Mas no meio dessa terrível pobreza havia umas poucas casas belíssimas habitadas pelos ricos, que tinham até trinta criados para cuidar deles. Esses homens ricos chamavam-se capitalistas. Eram gordos, feios, de caras perversas, como a que vês na página ao lado. Repara que veste um grande casaco negro, chamado fraque, e um chapéu estranho, brilhante, como uma chaminé truncada, e que se chamava cartola. Era esse o uniforme dos capitalistas e ninguém mais podia usá-lo. Os capitalistas eram donos de tudo no mundo, e todas as outras pessoas eram escravas deles.





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