1984 - Cap. 8: Capítulo VIII Pág. 93 / 309

Winston foi ao balcão e voltou com dois outros meios-litros. O velho parecia ter esquecido seus preconceitos.

- És muito mais velho que eu - disse Winston. - Devias ser adulto antes de eu nascer. Deves lembrar como era a vida antigamente, antes da Revolução. Gente da minha idade não sabe nada daquela época. Só podemos ler nos livros, e o que dizem os livros pode não ser verdade. Gostaria de conhecer tua opinião a respeito. Os livros de história dizem que antes da Revolução a vida era completamente diferente do que é hoje. Reinava a mais terrível opressão, injustiça, pobreza - pior do que tudo que imaginamos. Aqui em Londres a maioria do povo nunca tinha bastante o que comer, do berço ao túmulo. Metade da população não tinha sapato. Trabalhava doze horas por dia, saía da escola aos nove anos, dormiam dez em cada quarto. Ao mesmo tempo havia um grupinho, de alguns milhares - os chamados capitalistas - ricos e poderosos. Eram donos de tudo quanto existia. Moravam em casarões lindos com trinta empregados, passeavam de automóvel e carruagem de quatro cavalos, bebiam champanha, usavam cartolas...

O rosto do velho se iluminou.

- Cartolas! - disse ele. -Engraçado que fale nisso. A mema coisa me veiu na cabeça onte, não sei pruquê. Tava pensano, fais tanto tempo que não vejo uma cartola! Acabaro, parece. A última veis que usei uma foi no entêrro de minha cunhada. E isso foi... Ah, bom, não sei mais a data, mas foi uns cinquenta anos atrais. Naturalmente aluguei ela prô entêrro, compreende, né?

- As cartolas não têm importância - disse Winston, com paciência. - A coisa é que esses capitalistas, mais alguns advogados e padres, e outros que tais, que viviam no meio deles, eram os donos da terra.





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