O Vil Metal - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 32 / 257

Em cada uma daquelas folhas de papel, encontrava-se uma passagem em verso que fora escrita e reescrita ao longo de meses de intervalo. Não havia quinhentas linhas que se pudessem dizer definitivamente terminadas. Ele perdera o poder para acrescentar algo; apenas tinha possibilidade de alterar esta ou aquela passagem, concentrando-se, ora aqui, ora ali, na sua confusão. Já não se tratava de uma coisa que criava, mas meramente de um pesadelo com que lutava.

Quanto ao resto, nos dois anos inteiros não produzira nada, à exceção de um punhado de poemas curtos - talvez uma dezena, ao todo.

Era muito raro conseguir atingir a paz de espírito em que a poesia, ou mesmo a prosa, se podia escrever. As ocasiões em que «não podia» trabalhar tornavam-se cada vez mais comuns. De entre todos os tipos de seres humanos, apenas o artista se aventura a dizer que-não pode» trabalhar. Mas é verdade; há de facto momentos em que lhe é impossível. Dinheiro mais uma vez, sempre o dinheiro! A sua falta implica desconforto, preocupações sórdidas, escassez de tabaco, a consciência permanente do malogro - implica, sobretudo, solidão. Como pode uma pessoa sentir-se coisa alguma senão solitária, com duas libras semanais? E jamais se escreveu um livro decente na solidão. Não subsistia a mínima dúvida de que Prazeres Londrinos nunca seriam o poema que concebera - não subsistia mesmo a mínima dúvida de' que nunca os terminaria. E nos momentos em que enfrentava os factos, próprio Gordon estava bem ciente disso.

Não obstante e em particular por essa mesma razão, não desistia. Em algo a que se podia apegar. Uma maneira de refutar a sua pobreza e solidão. E, no fundo, havia ocasiões em que o estado de espírito da criação reaparecia, ou parecia reaparecer. Reaparecera naquela noite, por um breve lapso de tempo - o suficiente para fumar dois cigarros. Com o fumo a inundar-lhe os pulmões, abstraía-se do mundo mesquinho actual. Mergulhava a alma no abismo onde a poesia é escrita. O bico de gás silvava, calmante, sobre a sua cabeça. As palavras tornavam-se coisas vívidas e momentosas.





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