Os Pobres - Cap. 4: III - As mulheres Pág. 30 / 158

É a gente ser menos que nada e eles serem tudo. Aí têm o que é o amor. Ele a bater-me e eu a dizer cá comigo: – Tu que me bates é porque gostas de mim... – Aí têm o que é o amor, é a gente ser menos que um cão...

Eu escrava, ele o senhor. Acabou-se! todas temos de sofrer.

– Todas. Não há nada pior do que nascer mulher.

– Eu nunca tive sorte. Que me importava a mim que ele me batesse? Punha-me a olhar pra as nódoas do meu corpo e a dizer cá por dentro: – Este é meu amigo.

– Um dia partiu-me um braço, mas a gente é como os cães, que só gostam dum dono que lhes dê pontapés. O pior foi que ele botou-me ao desprezo. Os homens são todos o mesmo... Vidas! vidas! Um dia disse-me: – Estou farto de ti. – E sabeis? nunca mais falou pra mim. Ai, quanto mais se pena p’ramor dum homem mais se lhe vem a querer! – Mas deixa-me gostar de ti... – Vai ele e disse-me: – Fora! – E eu fiquei passada. O meu comer eram lágrimas. E bebia a toda a hora para atormentar uma dor que se me pusera no coração. Mas ele vem! ele torna!... Qual!...

– Como se chamava?

– Que te importa? Não é bom alumiar os mortos.

Deixai estar quem está quieto. Ah! se vós o vísseis morto como eu vi!... Ver morto um corpo que se teve nos braços é como ver no caixão um filho. Por mais que a gente grite não lhe dá vida! Trazia sempre no coração a mesma dor... Vai uma vez vesti-me sossegada e fria como defunta e fui ter com ele.

– A que vens? – disse ele. E eu disse-lhe: – A servir-te.

– E ri-me. – Já sei que me não podes ver, acabou-se!

não me importo. O que te peço é que me deixes servir-vos.

Venho ser vossa criada. – Ele pôs-se a rir. Depois veio ela e eu pus-me a rir também – Venho ser vossa moça, quanto me dais de soldada? – Eles cochicharam.





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