Eurico, o Presbítero - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 26 / 186

Mas, ai de mim!, essa imagem que parece sorrir-me nas solidões do espaço está estampada unicamente na minha alma e reflecte-se no céu do oriente através destes olhos perturbados pela febre da loucura, que lhes queimou as lágrimas.

Tu, Hermengarda, recordares-te?! Mentira!... Crês que morri, ou porventura, nem isso crês; porque para creres era preciso lembrares-te, e nem uma só vez te lembrarás de mim!

Lá, no tumulto dos cortesãos, onde o amor é cálculo ou sentimento grosseiro, terás achado quem te chame sua, quem te aperte entre os braços, quem tivesse para dar a teu pai o preço do teu corpo e te comprasse como alfaia preciosa para serviço doméstico. O velho estará contente, porque trocou sua filha por ouro.

A isto chama prudência o mundo estúpido e ambicioso; a isto, que não é mais do que uma prostituição abençoada sacrilegamente perante as aras sacrossantas.

Oh, quantas vezes esse pensamento repugnante me tem feito vaguear louco pelas montanhas, uivando como o lobo esfaimado e tentando despedaçar os rochedos com as mãos, donde me goteja o sangue!

E tu folgas e ris! Oxalá nunca saibas quão intenso e atroz é o meu tormento, que devo velar diante dos homens debaixo de aspecto tranquilo, como se, em vez de martírio, ele fosse um abominável crime.

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E quem te disse, presbítero, que o teu amor não era um crime? Tens razão, consciência! Quando aos pés do venerável Siseberto o gardingo Eurico jurou que abandonava o mundo, devia despir as paixões que do mundo trouxera.





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