1984 - Cap. 21: Capítulo XXI Pág. 287 / 309

Começou a grafar os pensamentos que lhe vinham à cabeça. Primeiro escreveu em grandes letras trêmulas:

LIBERDADE É ESCRAVIDÃO

Depois, quase sem pausa, escreveu por baixo:

DOIS E DOIS SÃO CINCO

Houve então uma espécie de pausa. Sua mente, como se fugisse de alguma coisa, parecia incapaz de se concentrar. Sabia que sabia o que vinha depois, mas no momento não podia se lembrar. Quando se recordou, foi apenas através do raciocínio consciente do que deveria ser; não veio espontaneamente. Escreveu:

DEUS É PODER

Aceitava tudo. O passado era alterável. O passado nunca fora alterado. A Oceania estava em guerra com a Lestásia. A Oceania sempre estivera em guerra com a Lestásia. Jones, Aaronson e Rutherford eram réus dos crimes imputados. Nunca vira a fotografia que provava sua inocência. Nunca existira: ele a inventara. Lembrou-se de que recordara coisas contraditórias, mas eram apenas falsas lembranças, produtos de alucinação. Como tudo era fácil! Bastava render-se e tudo o mais sobrevinha. Era como nadar contra uma corrente -que o levasse para trás, por mais esforço que fizesse, e resolveu de repente dar meia-volta e nadar a favor, em vez de opor-se ao fluxo da água. Nada mudara, exceto sua atitude; e a coisa predestinada acontecera sempre. Mal sabia porque se havia revoltado. Tudo era fácil, exceto...!

Qualquer coisa podia ser verdade. Eram tolice as chamadas leis naturais. Era bobagem a lei da gravidade. "Se eu quisesse," dissera O'Brien, "eu poderia flutuar no ar como uma bolha de sabão." Winston raciocinara. "Se ele pensa que flutua no ar, e se eu simultaneamente pensar que o vejo flutuando, então a coisa de fato acontece." De repente, como um destroço submerso que aflora à tona, um pensamento rompeu-lhe no cérebro: "Não acontece de facto.





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