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Capítulo 19: XVIII - O Gabiru treslê

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Olha: eu sinto-me distante de ti, para que não fujas desfeita em luar. Gostava tanto de sentir a tua mão pousada na minha cabeça, tanto! Olha!...

Sob a Árvore – realidade ou ilusão? – uma figura se constrói de luar, na sombra opaca uma tremulina toma forma. Juntam-se os fios de luar, amontoam-se névoas e alguma coisa treme, prestes a fugir – mas viva! viva!...

Diríeis que é só um sorriso, um olhar muito triste... O Gabiru corre e tudo se esvai... Só a Sombra resta e um ruído de gotas de luar tombando sobre a Árvore.

Ele sorri e diz:

– Eis como se cria uma alma!

Todas as noites, muito tarde volta para ao pé da Árvore.

– Uma é terra, outra é luar – murmura. Quanto mais a Mouca sofre, mais esta se cria. Oh, não me fujas!

Vens com a noite, melancólica e pálida como as mortas arrancadas ao sepulcro. Criei-te de lágrimas. Os teus cabelos esparsos perdem-se na sombra. Nunca vi na escuridão os teus olhos, mas sinto a irradiação da tua alma!...

O Gabiru, na noite branca e calada, sente-a aproximar- se e olhá-lo muito tempo.

– Minha alma!

Nem um murmúrio. Noite a noite era mais o luar.

Absorvia tudo. A sua claridade misteriosa diluía a terra e as coisas. A Árvore imensa e só dor, a Árvore esmaecida, toda se desfazia em pó claro. E noite a noite também a Sombra opaca se tornava mais espessa e funda.

A certas horas o silêncio estremecia, num ai baixinho e triste. Era a criação! A alma da Sombra acordava. Ei-la!

ei-la!...

– Minha vida!

Via-a perfeitamente. O oval do rosto pálido, os negros cabelos compridos, inteiramente feita de sonho e de lágrimas. Só os olhos se perdiam em duas sombras, cega talvez de tanto ter chorado – por a outra rir.

– Não fujas!

Correu um dia para a Sombra.

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pág. 116 (Capítulo 19)

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Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 116

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154