O Mundo Perdido - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 3 / 286

Ela estava sentada: o seu perfil altivo, delicado, destacava-se com nobreza sobre o cortinado vermelho. Como era bela! Bela mas também inacessível, pobre de mim! Éramos amigos, muito bons amigos; todavia, não tinha podido arriscar-me para além de uma camaradagem comparável àquela que me teria ligado do mesmo modo a um dos meus confrades repórteres na Gazette: uma camaradagem perfeitamente sincera, perfeitamente amistosa, perfeitamente assexuada... é exacto que todos os meus instintos se eriçam diante das mulheres que se mostram demasiado sinceras, demasiado amáveis: tais excessos nunca pleiteiam a favor do homem que é objecto deles. Quando se esboça de um sexo para o outro um verdadeiro sentimento, a timidez e a reserva entram no cortejo, por reacção contra a perversa Antiguidade em que o amor acompanhava vezes demais a violência. Uma cabeça baixa, o olhar que se desvia, a voz que se extingue, estremecimentos, eis os sinais evidentes de uma paixão! E não olhos atrevidos, ou uma tagarelice imprudente. Eu ainda não era muito vivido, mas isso já aprendera... a não ser que tivesse herdado esta memória da raça a que chamamos instinto.

Todas as qualidades da mulher desabrochavam em Gladys. Alguns julgavam-na fria e dura, mas era puro engano. Aquela pele delicadamente bronzeada de uma tez quase oriental, aqueles cabelos negros e brilhantes, aqueles grandes olhos húmidos, aqueles lábios carnudos mas distintos reuniam todos os sinais exteriores de um temperamento apaixonado. No entanto, até aqui, eu fora incapaz de comovê-la.





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