Robinson Crusoe - Cap. 10: Capítulo 10 Pág. 182 / 241

Estive muito tempo sem saber o que queria dizer; finalmente, pensei com mais atenção, compreendendo que uma chalupa igual devia ter abordado as praias da terra de Sexta-Feira, impelida sem dúvida pela violência da tempestade. Inferi disto que algum buque europeu naufragara naquelas costas e que talvez o vento, tendo levado a chalupa, a arrastara até à margem; mas nem sequer me veio à ideia que aqueles desgraçados tivessem podido salvar-se graças a tal meio, nem tratei de informar-me de onde podiam vir: somente lhe disse que me descrevesse o barco.

Sexta-feira descreveu-o muito bem mas fez-se compreender melhor quando acrescentou com vivacidade: - Nós salvar homens brancos de afogar-se. Perguntei-lhe então se naquela chalupa iam, de facto, homens brancos.

- Sim - respondeu -; o bote estar cheio de homens brancos.

- Quantos havia?

Contou pelos dedos até dezassete. Informei-me também do que fora feito deles, e disse-me que viviam com a sua nação. Estas palavras sugeriram-me novas ideias. Ocorreu-me logo que poderia ser a tripulação do buque que se perdera à vista da minha ilha; pensei que, quando a embarcação encalhara, a tripulação, ao ver-se perdida, se atirara para a chalupa e depois teria chegado à terra dos selvagens.

Além disso, interroguei-o longamente a respeito daquela gente. Disse-me que ainda estavam vivos; que havia quatro anos que habitavam na sua terra, onde viviam tranquilos, graças aos víveres que os selvagens lhes cediam. Perguntei-lhe a seguir o que se passara para não os terem comido, e replicou:

- Eles ser irmãos com eles.

Queria dizer que tinham feito uma aliança, e acrescentou:

- Eles não comer homens senão quando fazem guerra.

Portanto, apenas comiam os prisioneiros de guerra. Bastante tempo depois aconteceu que, achando-se o céu puro e limpo, estava Sexta-Feira sentado no cume da colina situada a leste da ilha, de onde, como já disse, com tempo sereno descobrira o continente, e olhava com profunda atenção para aquele lado, quando no meio de um arrebatamento de surpresa se pôs a bailar, a dar saltos e a chamar-me com gritos descompassados, porque me encontrava a alguma distância. Perguntei-lhe o que queria.

- Oh, alegria! Oh, prazer! - exclamou. - Ver ali minha terra, ali minha nação!





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