Encontrando-nos muito perto de terra, avistámos dois animais enormes que desciam a correr do alto de um monte para a praia. Pareciam perseguir-se um ao outro com muito ardor. Era o macho que corria atrás da fêmea? Aquilo era um rapto de amor ou de fúria? Isso é que não podíamos discernir, mas senti-me mais inclinado a crer que fosse o segundo caso porque aqueles ferozes animais só se deixam ver de noite e, além disso, aquela gente, em especial as mulheres, haviam-se assustado extraordinariamente. Apenas ficou o homem que levava o dardo ou lança na mão; os demais fugiram todos. De qualquer modo, aqueles monstros, longe de se dirigirem para os negros, correram direitos ao mar, mergulharam na água e puseram-se a nadar, ora para um lado ora para outro, como se estivessem a brincar. Um deles encaminhou-se para onde nós estávamos e acercou-se mais do que eu esperava, embora estivesse prevenido. Havia, de facto, carregado a escopeta com a maior prontidão e ordenado a Xuri que carregasse as outras duas. No momento em que a fera ficou ao alcance de tiro descarreguei a escopeta sobre ela e acertei-lhe na cabeça. Começou por submergir-se e depois voltou a sair, fazendo mil esforços vigorosos, sumindo-se e aparecendo de vez em quando. Finalmente, arrastou-se para a margem, morrendo quando a alcançou, quer da ferida, que devia ser mortal, quer afogada pela própria água.
O espanto que causou o ruído do tiro àquela pobre gente nem imaginar se pode: alguns julgaram morrer de medo e caíram de costas; mas assim que viram que o animal morrera, que desaparecera no fundo do mar, e que eu os instava a regressar à praia, animaram-se, aproximaram-se e puseram-se a procurar a fera. Os sinais de sangue que se viam na água fizeram com que eu a descobrisse e, por intermédio de uma corda que lhe tinha passado em redor do corpo e que lhes atirei para que puxassem por ela, num instante a tiraram da água: era um leopardo dos mais raros, com formosas pintas e de uma beleza admirável. Os negros, não podendo adivinhar de que modo eu me arranjara para o matar, ergueram as mãos ao céu para manifestarem a sua surpresa.