Robinson Crusoe - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 82 / 241

Então, começou a preocupar-me o receio de que a febre voltasse, e recordei que os brasileiros usavam o tabaco como único remédio para as suas enfermidades. Tinha justamente no cofre um rolo já preparado e uma partida que ainda estava verde.

Dirigi-me ao cofre, sem dúvida guiado pelo Céu, porque encerrava dois remédios, um para a alma e outro para o corpo. Abri-o e encontrei o tabaco; também ali estavam fechados os poucos livros que tinha salvo; peguei numa das Bíblias, de que já falei, e que não abrira até então por falta de tempo ou por preguiça. Peguei, pois, na Bíblia e no tabaco, e pus ambas as coisas em cima da mesa.

Ainda não sabia como usaria aquele medicamento nem se então me conviria; mas resolvi empregá-lo de diversas maneiras, convencido de que alguma delas teria bom êxito. Arranquei uma folha e masquei-a, o que me embotou os sentidos, porque o tabaco era verde, e mais forte do que o que eu usava; depois pu-lo em infusão com rum durante uma ou duas horas para beber uma pequena dose desta poção ao deitar; por fim, deitei folhas no lume, aspirando o fumo tanto tempo quanto o pude suportar.

Enquanto duraram estas experiências, peguei na Bíblia e comecei a ler, mas o tabaco tinha-me transtornado a cabeça de tal modo que não pude continuar a leitura. Tendo aberto o livro ao acaso, li as palavras seguintes: «Invoca-me nos dias de aflição, eu te livrarei e tu me glorificarás.»

Era já tarde e o tabaco perturbara-me de tal maneira que fiquei sonolento. Deixei a lamparina acesa, para o caso de precisar de alguma coisa durante a noite. Antes de me deitar fiz o que nunca fizera: ajoelhei-me e roguei a Deus que cumprisse a sua promessa «de ajudar-me quando o invocasse nas aflições». Depois desta súplica imperfeita, bebi o rum, no qual tinha deitado o tabaco em infusão. O rum era tão forte, o tabaco dava-lhe um sabor tão desagradável que só a muito custo o acabei de beber; em seguida deitei-me na rede.





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