Robinson Crusoe - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 95 / 241

Resignei-me então aos desejos da Providência, que começava já a conhecer e a acreditar que dominava todas as coisas; de forma que tal descoberta nem me prejudicou o descanso nem me atormentou o espírito com ânsias inúteis de ir reconhecer a região.

Por outro lado, reflectindo, dizia para comigo que se aquela costa fizesse parte das colónias espanholas, acabaria infalivelmente por, mais cedo ou mais tarde, ver passar algum buque; ou, então, que a terra que divisava pertencia à costa que se estende entre aquelas colónias e o Brasil, costa habitada por tribos dos mais ferozes selvagens, canibais ou comedores de homens, que matam e devoram todos os que caem em seu poder.

Enquanto fazia estas reflexões caminhava tranquilamente. Notei que aquela parte da ilha era mais formosa do que a minha; as pradarias estavam cheias de verdura, esmaltadas de flores e salpicadas de muitas e frondosas árvores. Vi inúmeros papagaios, e tive grande vontade de apanhar um para o domesticar e fazer falar. Consegui, não sem trabalho, agarrar um novo, atordoando-o com um pau; recolhi-o, e depois de tê-lo feito voltar a si, levei-o para casa. Alguns anos passaram antes de o poder fazer falar mas, por fim, ensinei-o a chamar-me pelo meu nome de uma maneira inteiramente familiar, e o incidente que depois ocorreu divertirá quem continuar a ler.

Esta viagem foi muito agitada. Encontrei nas terras baixas animais, tomando uns por lebres e outros por raposas; eram, contudo, muito diferentes de todos os que até então vira. Matei vários, sem me atrever a prová-los. Além disso, teria sido culpado de me expor a comer alimentos duvidosos, sobretudo tendo-os muito bons, como as lamas, as tartarugas e os pombos. Finalmente, juntando a isto as minhas uvas, compreender-se-á que podia desafiar o mercado de Leaden-Hall a abastecer bem uma mesa, em proporção com os convidados. Se, por um lado, a minha situação era deplorável, eu devia, por outro, considerar-me muito ditoso porquanto, longe de estar reduzido às últimas privações, gozava de uma abundância que raiava já a profusão.





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