Ecce Homo - Cap. 15: Por que sou uma fatalidade Pág. 114 / 115
- A descoberta da moral cristã aparece como acontecimento sem par, como verdadeira catástrofe. Aquele que a põe a nu é uma força potente, uma fatalidade - divide a história da humanidade em duas partes: a dos que viveram antes, a dos que viverão depois... O raio da verdade caiu sobre tudo quanto até agora estivera no estádio mais sublime: e quem for capaz de compreender o que lá se destruiu, veja se lhe ficou ainda alguma coisa nas mãos. Tudo quanto até hoje se chamou verdade foi desmascarado como forma da mentira mais perigosa, mais pérfida, mais subterrânea; o pretexto sagrado de «tornar os homens melhores» revela-se astúcia para esgotar a própria vida, para torná-la anémica sugando-lhe o sangue. A moral como «vampirismo»... O que descobre a moral, descobre com ela a transmutação de todos os valores, o não-valor de todos os valores em que se acreditava; já nada vê digno de veneração nos tipos mais venerados da humanidade, naqueles mesmos que foram canonizados, vê neles a forma mais fatal dos seres malogrados, fatal porque «fascinante»... A ideia de «Deus» foi composta, foi investi da como ideia contrária à vida - nela, em simbiose estupenda, se resume tudo quanto é nocivo, venenoso, caluniador, todo o ódio mortal contra a vida. A ideia do «além», do «mundo-verdade», foi inventada apenas para depreciar o único mundo que existe para destituir a nossa realidade terrestre de todo o fim, razão e propósito! A ideia de «alma», de «espírito» e, ao fim e ao cabo, ainda a de «alma imortal», foi inventada para desprezar o corpo, para o tornar doente - «sagrado» - para tratar todas as coisas que merecem atenção na vida - as questões de alimentação, habitação, regime intelectual, cuidados com os doentes, higiene, temperatura