Ignorava-se antes de mim do que era capaz a língua alemã, do que era capaz, de maneira geral, a linguagem. A arte do grande ritmo, o grande estilo do discurso para exprimir os intentos altos e baixos das paixões sublimes e sobre-humanas, fui eu quem os descobriu; com um ditirambo, como aquele do terceiro Zaratustra. Os Sete Selos, voei mil vezes mais alto que tudo quanto até hoje se chamou poesia.
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Que nos meus escritos fala um psicólogo como nunca houve igual, essa é decerto a primeira intuição a que chega um• bom leitor, um leitor digno de mim, que me leia como os bons velhos filósofos liam o se~ Horácio. As proposições sobre as quais no fundo e unânime toda a gente - para não falar dos filólogos -de fama mundial, dos moralistas, e de outros cabeças ocas ou cabeças de couve - aparecem nos meus escritos como formas de erro ingénuo: por exemplo, aquela crença de que «não egoísta» e «egoísta» são opostos, enquanto o próprio eu é simplesmente «mais alta vertigem», um «ideal»... Não há nem acções egoístas, nem acções não egoístas: ambos os conceitos são contra-sensos psicológicos. Contra-senso dizer: «O homem tende para a felicidade»... Ou «A felicidade é a recompensa da virtude»... Ou isto ainda: «Prazer e dor são opostos»... A Circe da humanidade, a moral, falsificou toda a psicologia do fundo ao topo - «moralizou-a» - até àquele horrível absurdo de que o amor deve ser alguma coisa de «não egoístico»... Quem não for consistente, quem não se segurar firmemente em ambas as pernas, não poderá amar. Muito bem o sabem as mulheres: para elas é um inferno tratar com homens desinteressados, com homens puramente objectivos... Será ousadia afirmar aqui, e a propósito, que conheço as mulheres? Isso faz parte do meu património dionisíaco.