Tornara-se uma leitora assídua de romances, pois a biblioteca pública situava-se apenas a dez minutos a pé de Briarbrae. Em vida, devido a qualquer mania, o avozinho Comstock proibira as filhas de ler romances.
Por conseguinte, como só começara a fazê-lo em 1902, a tia Ângela encontrava-se sempre duas décadas atrasada em relação à moda corrente, no capítulo da ficção. Isso não a impedia, porém, de persistir no hábito. Em 1919, ainda lia Rhoda Broughton e Mrs. Henry Wood. Nos anos da Guerra, descobriu Hall Caine e Mrs. Humphrey Ward. Na década de 1920, lia Silas Hocking e H. Seton Merrimali, enquanto na de 1930 quase, embora não inteiramente, estava a par de W. B. Maxwell e WiIliam J. Locke. Daí, nunca passaria. Quanto aos romancistas do pós-Guerra, ouvira mencioná-los vagamente, com a sua imoralidade, blasfémias e «esperteza» devastadora. Mas nunca chegaria ai lê-los. Lemos Walpole, assim como Hichens, mas quem és tu, Hemingway?
Bem, isto era em 1934 e dizia respeito ao que restava da família. O tio Walter, com as suas «agências» e doenças. A tia Ângela, entretida a limpar o pó do serviço de chá chinês de Crown Derby, A tia Charlotte ainda preservava uma vaga existência vegetal na clínica de doentes mentais. Júlia trabalhava setenta e duas horas semanais e «costurava» à noite junto do pequeno calorífero de gás, na sala-quarto. Gordon, quase com trinta anos, ganhava duas libras semanais num emprego inconcebível e lutava, como único objecto demonstrável da sua existência, com um livro horrível que nunca avançava.
Havia possivelmente alguns outros Comstock, de parentesco mais distante, pois o avozinho Comstock pertencera a uma família de doze membros, mas se algum sobrevivera, enriquecera e cortara o contacto com o ramo pobre, pois o dinheiro é mais espesso que o sangue. Quanto ao ramo de Gordon, o rendimento combinado dos cinco, contando com a quantia avultada paga quando a tia Charlotte ingressara na clínica, devia rondar as seiscentas libras anuais.
