Eram canecas grossas, de modesta qualidade, quase tão espessas como frascos de compota, e pouco limpas. A cerveja apresentava uma superfície de espuma que se dissolvia gradualmente. A atmosfera achava-se impregnada de fumo de tabaco denso como o da pólvora. Ravelston descortinou uma escarradeira necessitada de ser esvaziada junto do balcão e desviou os olhos.
Acudiu-lhe ao pensamento a possibilidade de a cerveja ter sido aspirada de uma cave infestada de baratas através de tubo pegajoso e as canecas apenas mergulhadas em água acervejada e nunca lavadas devidamente. Entretanto, Gordon tinha um apetite devorador. Não lhe desagradaria tragar uma ou duas sanduíches de queijo, mas se as pedisse denunciaria o facto de que não jantara. Ao invés, ingeriu um longo trago de cerveja e acendeu um cigarro, que lhe fez esquecer um pouco a fome. Ravelston também se serviu da sua e pousou a caneca com suavidade. Era cerveja tipicamente londrina, apesar do que deixava um certo sabor químico na boca que o fez pensar nos vinhos da Borgonha. Continuaram a conversar sobre o socialismo.
- É altura de começar a ler Marx, Gordon - disse Ravelston, menos apologeticamente do que de costume, porque o gosto detestável da cerveja o irritara.
- Preferia ler Mrs. Humphry Ward.
- Mas não vê que assume uma atitude irrazoável? Está sempre a lançar remoques contra o capitalismo e, por outro lado, recusa-se a aceitar a única alternativa possível. Não se podem endireitar as coisas num meio-termo. Ou se aceita o capitalismo ou o socialismo. Não há que fugir disto.
- Já disse que não quero perder tempo com o socialismo. A simples ideia provoca-me sono.
- Em que baseia as suas objecções?
- Só existe uma objecção ao socialismo: ninguém o quer.
- Que posição tão absurda!
- Isto é, ninguém que compreenda o seu verdadeiro significado.
- A que significado se refere?
- Bem, uma espécie de Bravo Novo Mundo, de Aldous Huxley, mas menos divertido: Quatro horas por dia numa fábrica-modelo, a apertar a porca número seis mil e três.