Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 27: XXI - Aí têm os senhores a natureza!

Página 157
As fontes deitam oiro, as plantas têm fios de oiro e no chão há toalhas e caminhos de oiro e sombras.

– Senhor Pita, eu quero ser isto...

– Isto quê? – resmunga o outro concentrado.

– Quero ser isto!...

Mas Pita, enfronhado nos cálculos, resmoneia:

– Maquinações filosóficas. Deixa-me... Eis a diferença – 22$000 réis... Eis!...

O Gabiru caminha. Depois cai entre a erva tenra e nascida e deita-se a ver os rabiscos do sol e um galho tão em flor, que parece uma teia de luar esquecido. Primeiro o tronco incha: há como ponto negro que estoura, para ser botão e depois flor... Medita. Está um dia morno e húmido. Saíram das tocas os bichos internados todo o inverno. Vespas passeiam a sua roupa de oiro no mármore das flores e toda a terra remexe. Acreditá-la-íeis viva.

Em que se põe a pensar? O seu ouvido de enclausurado, afeito ao silêncio, ouve até ao fundo da terra o rumor dos bichos, tanto tempo empedernidos, que esfuracam para o sol; das sementes que rebentam e sobem para a luz, o glu glu das raízes gordas e felizes ao mergulharem no húmus.

É um barulho de maré longínqua que cresce, galga, aumenta, transborda... Espavorido deita a correr... Por toda a parte as sebes, as ervas escondidas, os tojos bravios, para quem ninguém repara, crescem. Há-os nas pedras; há-os no ventre ressequido dos calhaus.

Anda, anda, e dá com águas grossas, felizes, apressadas; com quinta-loiros onde a verdura cresce aos borbotões; pinheiros, depois silvas, bravios – e até nos sítios mais estéreis encontra a mesma vida e o mesmo amor.

Que força é esta que faz mexer a terra e a abala?

É uma torrente, um rio subterrâneo branco e verde, que vem à supuração? Um riacho de tintas, brotando à superfície do solo em labaredas verdes, todas roxas, inteiramente brancas? Há verdura tão ténue que di-la-íeis uma névoa verde; folhinhas que parecem feitas de um hálito que se pegou aos troncos.

<< Página Anterior

pág. 157 (Capítulo 27)

Página Seguinte >>

Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 157

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154