– Que coisa enorme e bela que é uma árvore! É diferente da outra... E é uma árvore? Uma árvore dá água, ouço a água a cair.
– E o ruído das suas folhas.
– Uma árvore é viva. Fala? É o ser mais belo que eu conheço. É verde, mexe-se...
– E ali, longe, um monte.
– Aquilo pequeno? Um torrão como este que os meus pés desfazem. Só é violeta. Maior é uma árvore!
maior!... E esta poeira luminosa que nos envolve, que é?
Alma?
– Maquinações filosóficas... Caminha agora, vê...
Eu vou-me deitar à sombra... Podes ver...
O Pita tirou as botas e estendeu-se ao pé dum sobro.
Da algibeira sacou o caderno de notas e pôs-se a escrever:
Deve à D. Antónia três meses em atraso – 30 500 rs.; a Haver das explicações da natureza aos domicílios – 25$000... Diferença...
O Gabiru vai andando ao acaso. Pica-se nos espinhos, esmaga entre as mãos flores e rebentos, magoa-se nas pedras. Encontra sebes orvalhadas, árvores brancas todas flor, abrunheiros em flor, e uma hora fica absorvido de. fronte dum velho muro, encostado ao qual uma macieira treme, carregadinha de flor. Há galhos que lhe parecem emoção. Os pés calcam ervas espezinhadas, que também deitam cá fora o seu sonho; esquece-se ao pé das fontes vendo-as jorrar e põe-se a respirar fundo, querendo embeber-se daquele ar carregado de vida.
De repente cai um destes chuveiros de primavera, precipitados e rápidos. A chuva que tomba é morna. As plantas bebem-na, as flores abrem-se tontas e escondem gotas nas corolas; vêem-se crescer as pequeninas folhas verdes como se inchassem e os gomos tingidos de resina estalam, abrem, com um ruído sufocado – ah!... Tudo fica baço a princípio, a terra molhada é dum negro gordo; um frémito corre nas folhas tenras... Depois, como um véu que se rompe, o sol começa de novo a correr.