Robinson Crusoe - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 210 / 241

Então Sexta-Feira exclamou no seu inglês mascavado:

- Oh, senhor! Senhor ver homens ingleses comer prisioneiros, como homens selvagens!

- Porquê, Sexta-Feira? - respondi-lhe. - Não julgues que vão comê-los.

- Sim - prosseguiu -, eles querê-los comer.

- Não, não - repliquei -; receio, é verdade, que queiram matá-los mas podes ficar certo de que não os comerão.

Apesar de tudo, não compreendia o significado daquilo; tal cena, porém, amedrontara-me, esperando a todo o instante ver sacrificar os prisioneiros. Uma das vezes, um daqueles malvados ergueu um punhal enorme para ferir um deles, e como eu pensava ver cair já o infeliz, o sangue gelou-se-me todo nas veias. Lamentava com toda a dor do meu coração não ter a meu lado o espanhol e o selvagem que o acompanhara; encontraria, de certeza, um meio para chegar, sem ser descoberto, ao alcance de tiro de espingarda daqueles miseráveis, a fim de libertar os três prisioneiros, pois não via nas mãos dos seus carrascos nenhuma arma de fogo. Bem depressa, contudo, me ocorreu outro expediente.

Após a terrível ameaça feita aos prisioneiros pelo insolente marinheiro, notei que os seus camaradas se dispersavam pela ilha, sem dúvida com o objectivo de reconhecer o local, e que os três desgraçados se acharam livres para ir onde melhor lhes parecesse; sentaram-se, porém, no chão, aflitos e desesperados. Isto recordou-me o momento da minha chegada à ilha, e comecei a entrever a minha situação. Lembrei-me de como me tinha sentido perdido, com que ar olhara à minha volta, que terríveis angústias experimentara e como passara a noite em cima de uma árvore, com medo de ser devorado pelas feras.

Tal como eu então não esperava ver naquela noite, em que a tempestade e o mar o atiraram irremediavelmente para a margem, o buque que me abastecera de utensílios e alimentos, assim também aqueles três desgraçados não contavam com a sua próxima liberdade no momento em que se julgavam perdidos sem apelo.





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